São Paulo, domingo, 12 de maio de 1996
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Dá-lhe novela

MARCELO MANSFIELD
ESPECIAL PARA A FOLHA

Nem a volta de Getúlio, nem a rivalidade entre Emilinha e Marlene, nem a megalomaníaca inauguração da Vera Cruz sacudiria tanto a terra de Santa Cruz como a chegada da televisão.
Tão ansiosamente esperada era, que uma moreninha de Taubaté chamada Hebe Camargo não aguentou e correu para o porto de Santos, ao lado de seu chefe, Assis Chateaubriand, para ver desembarcar aquela montoeira de equipamentos do qual ela seria sua mais completa tradução.
A importância da novidade era tão grande, que assim como a declaração da Independência, ou a proclamação da República, ou mesmo a própria pátria, mereceu um hino cantado por Lolita Rodrigues logo após Yara Lins anunciar que a PRK 3 TV estava no ar.
A primeira a TV do maior país católico do mundo exibia nessa noite histórica, obviamente, um frei, José Mojica cantando seus sucessos.
A televisão acabaria com o analfabetismo em dez anos. A marchinha de carnaval, tão ao gosto do público do seu tio mais velho, e o cinema, seriam trocados pela boa música erudita, e textos clássicos tomariam o lugar dos melodramas circenses.
Inaugurada na voz de um padre, a coisa se tornou um conto do vigário. No dia seguinte à sua inauguração, as cabeças pensantes deste novo eletrodoméstico não tinham nada para pôr no ar. O jeito foi correr para seu vizinho mais próximo, o rádio.
Iniciavam-se ali duas tradições nacionais: o televizinho e a telenovela.
Entre um "remake" e outro, Bráulio Pedroso inovou ao escrever "Beto Rockefeller" e "O Cafona". Janete Clair se consagraria quando mandou Edwin Luisi matar Salomão Hayalla antes dele, Edwin, se casar com a "Escrava Isaura", estrelada por Lucélia Santos, que esteve no "remake" de "Sangue do Meu Sangue".
Mas nem só de "remakes" (melhor esclarecer: remake significa "...o que a gente vai fazer agora?") vive a telenovela.
Ciganos e gêmeos dão bom caldo. Ana Rosa foi tudo, gêmea e cigana, em "Alma Cigana". Tony Ramos, Glória Pires e Cristiane Torloni foram gêmeos. A "grande dama da TV", Laura Cardoso, foi cigana em "Quatro Brasileiros em Paris", o filme, e "Explode Coração", a novela.
Já não se fazem mais atrizes como ela. Nem como Geórgia Gomide, que teve que se esconder na "Casa São Nicolau", na praça do Patriarca, para não apanhar dos fãs de "Tereza", onde era tão má, mas tão má, que fez Anne Baxter em "A Malvada" parecer "Irmã Catarina" onde, aliás, cachoeira é proibido.
O jeito é apelar para a idéia inicial da TV: alfabetização e cultura. Ligue seu televisor às 7h00 para ver o Telecurso e, uma vez por mês, nos programas de concertos clássicos da Globo e Cultura. E claro, no nosso maior clássico: Hebe Camargo... sempre um prazer.

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