São Paulo, domingo, 19 de maio de 1996
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Mulheres do ITA não namoram colegas

DA REPORTAGEM LOCAL

Passaram-se mais de dois meses e as três únicas alunas do ITA (Instituto Tecnológico da Aeronáutica) continuam mantendo os 442 colegas homens à distância.
A paulista Karina Diogo de Souza, 16, a mineira Patrícia Silva Rodrigues, 18, e a carioca Christianne Basílio e Silva, 16, são as primeiras alunas a serem aceitas em 45 anos do ITA, a escola de engenharia mais rigorosa do Brasil.
Elas afirmam que, apesar da rotina puxada (entram em sala às 8h e têm aulas até as 17h), sempre encontram tempo para namorar. Mas os eleitos estão longe de São José dos Campos (97 km a nordeste de São Paulo), onde fica a escola.
"Namoro um cara há um ano e sou fiel a ele", vai avisando Christianne, que, nas horas vagas, gosta de ler revistas de ciência. Patrícia tem um namorado em Belo Horizonte. "Nos encontramos no fim de semana", diz.
Karina é a única que está desimpedida. Ela terminou um namoro "que já não ia bem", antes de mudar-se para São José dos Campos. Diz que continua livre. "Conheci gente de muitos lugares aqui e isso foi muito bom", desconversa.
Porkys
A chegada de três mulheres a um curso frequentado só por homens poderia desencadear uma reação do tipo "Porkys" -a comédia americana cheia de trotes e brincadeiras de gosto duvidoso.
Nada disso aconteceu -nem nesse estilo, nem em nenhum outro. A integração das calouras com os rapazes, a bem da verdade, ainda é uma incógnita.
"O contato delas com a gente é muito pouco", diz o calouro Luciano Angeli, 17. "Passamos a maior parte do tempo estudando."
O professor Valter Winckel, de matemática, arrisca uma outra explicação."Já ouvi gente reclamando que elas são meio fechadas", afirma.
A comunicação, de fato, não é muito facilitada. As meninas foram acomodadas no Hotel de Trânsito, que também fica no Campus, mas a cerca de 300 metros do alojamento dos rapazes.
"O ideal seria que elas ficassem em um quarto no H-8 (nome do alojamento dos rapazes)", diz o aluno do 2º ano Luís Acosta, 21. "É aqui que se aprende a disciplina consciente, de respeito ao colega, e outras tradições da escola."
Ele conta a história de um aluno "bem-intencionado", que foi dar boas-vindas a elas no hotel e acabou barrado pelo porteiro. "O objetivo não é fazê-las diferentes, mas iguais", diz.
Boas alunas
Apesar do confronto na proporção de 3 para 442, as meninas têm se saído bem no curso.
Em matérias como matemática e física, elas estão acima da média. "As três são alunas MB (Muito Bom)", diz o professor Winckel.
Elas também superaram as expectativas em treinamentos obrigatórios, como o CPOR -Curso de Preparação dos Oficiais de Reserva-, que ensina a marchar, usar armas e acampar.
"A Karina é a 01 no CPOR", dizem as colegas. 01 é a classificação dada ao melhor aluno do curso.
Karina está disposta a seguir a carreira militar opcional. O curso do ITA tem cinco anos, e, depois, os alunos que quiserem poderão tornar-se oficiais da Aeronáutica.
Com todo esse desempenho, as meninas que foram aprovadas no vestibular deste ano ainda não sabem se pretendem ficar até o fim.
"Estou no começo do primeiro ano e preciso ver se é isso mesmo que eu quero", diz Christianne, que prestou vestibular também para cinco escolas de engenharia, duas de medicina e duas de física. Ela passou em todas.

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