São Paulo, domingo, 19 de maio de 1996 |
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"O Fim do Mundo" exagera no 'déjà vu' e repete antigos sucessos
MARIANA SCALZO
Um bom exemplo é a mininovela "O Fim do Mundo", exibida às 20h40, na Rede Globo. O texto de Dias Gomes causa a impressão de que o telespectador está de volta à Sucupira de "O Bem-Amado", ou à Asa Branca de "Roque Santeiro". Os personagens da novela podem ser considerados velhos conhecidos: o coronel poderoso, a mulher (às vezes prefeita, outras delegada) que comanda a cidade, as moças do bordel, as senhoras conservadoras. Para Renata Pallotinni, professora doutora do Departamento de Teatro da ECA (Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo), "o déjà vu de 'O Fim do Mundo' chocou muito. Até o cenário parece que saiu de outra trama." "A melhor novela já produzida foi 'Roque Santeiro'.'O Fim do Mundo' apresenta vários elementos de lá. Isso pode ser motivado pelo sucesso. Mas isso não é próprio do gênero", diz. Universo próprio Os autores de novelas trabalham em um universo ficcional e, segundo Pallotinni, "é natural conseguir identificar um autor e seu trabalho. Cada um tem a sua memória." "O Benedito Ruy Barbosa é rural. O Dias Gomes trabalha com o interior da Bahia, a zona do cacau. Gilberto Braga usa a cena urbana do Rio, Cassiano Gabus Mendes, a paulista", diz. Dias Gomes concorda. "Isso é fácil constatar. Por outro lado, cada autor tem também as suas preocupações obsessivas, que traduzem sua visão de mundo." Para ele, isso explica por que "O Fim do Mundo" lembra "Roque Santeiro", "Saramandaia" e "O Bem-Amado". Mauro Alencar, consultor de telenovelas da Globo e professor da Oficina de Atores da emissora, também aceita a tese do universo único dos autores. "É natural a pessoa trabalhar melhor com seu universo, na literatura também é assim. Mas é possível encontrar diferenças dentro de cada universo." "Não dá para falar que Gabriela é igual a Tieta só porque as duas personagens são mulheres sensuais ou que 'O Guarani' e 'Iracema' são o mesmo romance porque tem como tema índios." Segundo Alencar, o universo é o mesmo, mas a obra é outra. "A maneira de tratar o assunto muda, a pontuação é diferente." "As duas irmãs conservadoras (Zizi e Fafá Badaró) de 'O Fim do Mundo' não tem nada a ver com as Cajazeiras. Em 'O Bem-Amado', elas se faziam de moralistas, donzelas juramentadas, mas se envolviam com o prefeito", exemplifica. Saturação Apesar da sensação de repetição, Pallotinni não acredita na saturação das telenovelas. "A novela tem vida longa. O gênero ainda está muito vivo. Acho o (Walter George) Durst fantástico. Queria ver Lauro César Muniz escrevendo novelas. Ele e o Silvio de Abreu variam muito seus mundos." Segundo ela, "a teledramaturgia sofre em alguns momentos, há uma certa ondulação. Tem de existir renovação de autores." Gomes ressalta que seu universo é maior que o mundo ficcional de "O Fim do Mundo", "Roque Santeiro", "Saramandaia" ou "O Bem-Amado". "Acho que é uma simplificação achar que esse é todo meu universo. Lembro que 'Bandeira Dois', 'O Espigão', 'Sinal de Alerta' e 'Araponga', que também têm um parentesco entre si, diferem bastante das outras, pelo menos formal e tematicamente", alega. "Isso sem falar nas minhas peças teatrais, 'O Pagador de Promessas', 'O Santo Inquérito', 'Vargas', etc., onde se pode encontrar semelhanças no aspecto ideológico. Este sim, comum a todas, o que é uma questão de coerência", completa. Pallottini levanta ainda outro problema de "O Fim do Mundo". "É uma minissérie. Foi lançada como novela por motivos operacionais." Texto Anterior: Programa discute 'o belo' Próximo Texto: NADA SE CRIA, TUDO SE COPIA Índice |
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