São Paulo, quarta-feira, 22 de maio de 1996
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Juros assassinos

ANTONIO DELFIM NETTO

As autoridades monetárias têm insistido em que a taxa de juro vem baixando desde o começo de 1996. O problema é que, apesar disso, elas são ainda "escorchantes", como disse o sr. presidente.
No ano passado, o Tesouro pagou uma taxa de juro real para seus papéis da ordem de 30%. Em 1996 essa taxa deve situar-se em torno de 16%. Mas, para o setor privado, a situação é bastante diferente. Uma pequena ou média empresa nacional, com bom cadastro, ainda paga de 4% a 4,5% de juro nominal mensal para obter capital de giro, o que corresponde a 65% ao ano.
Se elas podem corrigir seus preços (devido às pressões de custo, porque a pressão de demanda é nula) em torno de 12%, chega-se à conclusão de que elas estão pagando uma taxa de juro real da ordem de 47% ao ano!
Esse fato mostra a brutal discriminação da atual política monetária contra a pequena e média indústria nacional. Produz-se uma concentração da produção em grandes empresas nacionais e nas empresas estrangeiras, as quais podem obter recursos à taxa de 19% ao ano em dólares. Apesar de ser metade da anterior, ela também é terrivelmente elevada quando comparada à de seus concorrentes globalizados.
As taxas reais de juro pagas pelo Tesouro Nacional ainda são enormes diante das vigentes em outros países. A tabela abaixo mostra a taxa de juro real anual paga pelos papéis de cem dias do Tesouro de cada país (última semana de abril):
Hoje a taxa de juro real do Tesouro Nacional está em torno de quatro vezes a média desses países. Em 1995 ela esteve oito vezes maior!
As consequências que tais taxas de juro produzem sobre a estrutura produtiva do país são dramáticas. Não é sem razão que em estado de desespero juntam-se hoje em Brasília empresários e trabalhadores, para tentar mostrar ao governo que ele está liquidando a pequena e média empresa nacional e os seus empregos.
E o que é pior: com tais taxas de juro o nível de investimento se reduz e os seus efeitos se prolongarão no futuro.
Pesquisas empíricas recentes apontam a "independência" do Reichsbank (o antecessor do Bundesbank) como a principal suspeita do assassinato de uma república: a de Weimar.
Insistindo numa taxa de juro extremamente elevada para manter o controle da oferta monetária diante de uma grande entrada de capital, a política do Reichsbank desestimulou os investimentos e gerou queda da taxa de crescimento da economia e o aumento do desemprego.
Como disse Harold James ("The German Slump"), esse "baixo crescimento matou a república e a democracia". Mas é claro que o Brasil não é a Alemanha dos anos 20...

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