São Paulo, quinta-feira, 23 de maio de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

"Pavilhão Japonês" leva a comédia "trash" ao palco

NELSON DE SÁ
DA REPORTAGEM LOCAL

Já quando foi editada, na entrada dos anos 90, a qualidade de "Pavilhão Japonês" era o prazer da irresponsabilidade. Diante das ambições gigantescas, geracionais de "Tutankaton", que dava título à reunião de peças de Otavio Frias Filho, a leitura de "Pavilhão Japonês" surgia como brincadeira, que permitia ao leitor fantasiar.
Fantasiar como então os espetáculos do gênero, "surrealista", não permitiam mais -e como a rígida "Tutankaton", a melhor peça do volume e do dramaturgo até hoje, chegava mesmo a reprimir. Cinco anos depois, o diretor Mauricio Lencasttre não faz mais do que entrar na brincadeira.
Lencasttre, também ator, esteve em "Lulu", dirigida há dez anos por Carmem Paternostro, com Bete Coelho e Luís Melo -que definiram uma geração de atores. "Lulu" foi definidora, também ela, do "surrealismo" incompreensível popularizado depois.
O que surgiu incompreensível Maurício Lencasttre, já diretor, tornou cômico. "Beckett in White", depois "A Comédia", está há dois anos em cartaz por conta de reunir surrealismo e besteirol. A fórmula retorna com "Pavilhão".
Certo, "Pavilhão Japonês", a montagem, ainda merecia bons meses de ensaio, para a sintonia fina da mise-en-scène. Também merecia bons milhares de dólares, para diminuir o amadorismo em cenário, sonoplastia e iluminação.
Mas talvez seja precisamente o objetivo de Lencasttre. O diretor viu na peça, é evidente pela encenação, a versão para teatro dos filmes "trash" das tardes na TV, ou da literatura "pulp". E mais uma vez: certo, as alegorias originais desaparecem -do campo do raciocínio, ao menos. Mas é o preço a pagar pelo que é também, por assim dizer, tradição do teatro nacional, a chanchada, o besteirol.
O enredo é descrito vagamente como o "assassinato de uma mulher em um parque, que é visitado por adolescentes (que tentam) escapar do possível assassino".
Confundindo clichês de toda sorte, do teatro do absurdo às histórias em quadrinhos às atrizes de Zé do Caixão, "Pavilhão", o espetáculo, surge assim inconsequente e "realista" como algum episódio de Beavis and Butt-head ou algum filme de "serial killer chic".
(Ou ainda, para voltar no tempo, ao ano anterior à criação da peça, algum filme de River Phoenix como "Stand by Me", de enredo muitíssimo semelhante -talvez mais do que a assumida paráfrase da "absurda" peça "Icaru's Mother", de 1965, de Sam Shepard.)
O resultado são tipos-personagens contemporâneos dos mais engraçados, como o perverso Tuca de Rodrigo Hornhardt, a sensual Jô de Tuca Medina e a histérica -e por vezes incompreensível- Fugitiva de Gabriela Neri.

Texto Anterior: Páginas trazem bons "links"
Próximo Texto: Desafio é enclausurar o Belo numa definição
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.