São Paulo, domingo, 26 de maio de 1996
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Americano descobre músculo estudado no Brasil há 18 anos

RICARDO BONALUME NETO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Pesquisadores americanos anunciaram no começo do ano a sensacional descoberta de um novo músculo envolvido na mastigação, algo que estranhamente teria escapado à atenção dos anatomistas por centenas de anos.
Mas o novo músculo -que ainda não tem esse status entre os anatomistas- já tinha sido estudado detalhadamente por pesquisadores brasileiros em 1978.
O único problema é que o trabalho dos brasileiros tinha sido publicado em uma revista científica de reduzida circulação pelo planeta -a "Revista da Faculdade de Odontologia", publicada em Araraquara (SP) pela Unesp (Universidade Estadual Paulista)-, além de estar em português.
A "descoberta" era tão sensacional que os cientistas americanos checaram cuidadosamente a literatura médica, dissecaram 25 cadáveres e esperaram um ano para a divulgação do achado.
"Era como dizer ao seu vizinho que ele não estava vendo um elefante na sala de estar dele", diz o dentista Gary Hack, da Universidade de Maryland (EUA), que pesquisou o músculo.
Existem quatro músculos conhecidos com papel na mastigação, e esse seria o quinto.
Os pesquisadores americanos Hack e sua colega Gwendolyn Dunn anunciaram a descoberta na reunião da AAAS (Associação Americana para o Avanço da Ciência) em fevereiro passado.
Os meios de comunicação divulgaram o achado, e os pesquisadores brasileiros, ao verem que se tratava do mesmo estudo feito em 1978, enviaram uma cópia de seu trabalho aos colegas americanos. O artigo brasileiro foi assinado por Luis Roberto de Toledo Ramalho, Carlos Landucci e Hélio Ferraz Porciúncula.
"Estamos fascinados com o trabalho, é excelente. Vamos entrar em contato com eles, e vamos citá-lo nos nossos artigos", disse Hack à Folha em uma entrevista por telefone. "A descrição deles vai além de tudo que nós vimos em qualquer livro-texto", acrescenta. Eles chegaram a pesquisar em 15 livros-texto de anatomia sem conseguir os detalhes do novo músculo, o que fora feito pelos pesquisadores de Araraquara.
O novo músculo não foi considerado como tal pelos brasileiros. Para eles, trata-se de uma parte de outro, o músculo temporal. Foi chamado de "feixe profundo" do temporal, um músculo em forma de leque que cobre boa parte do lado da cabeça.
"Não quero criar polêmica, só registrar que 18 anos atrás nós já sistematizamos a sua forma e função", diz Toledo Ramalho.
"Esse é o único ponto em que nós discordamos", diz Hack. "Dados muito interessantes indicam que é um músculo diferente".

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