São Paulo, segunda-feira, 3 de junho de 1996
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Choque de tribos originou conflito racial

ROGÉRIO C. DE CERQUEIRA LEITE

na África do Sul
Para começarmos a compreender o continente africano é essencial o conhecimento da gênese da raça negra.
As teorias razoáveis sobre a origem da raça humana atribuem à África o berço do homem.
Com a introdução da agricultura, desenvolve-se o Egito velozmente. Em 3000 a.C., concentrava-se às margens do Nilo uma população de 1,5 milhão, tanto quanto no resto da África.
Um pouco antes da Revolução Agrícola, as seis etnias que constituíam a África eram formadas por 100 mil hamitas (egípcios e berberes) dispersos pela costa norte-africana, 200 mil pigmeus no centro-oeste, 350 mil bosquímanos ao sul e sudeste, 250 mil negros no norte, 250 mil nilo-saarianos e 100 mil cushitas, uma etnia intermediária, nem branca nem negra.
Agricultura
Daí em diante, progrediram apenas os povos que se adaptaram à agricultura.
Cresceram as populações egípcia e negra. As pastoris, como os berberes, ou nômades, como os bosquímanos e pigmeus, estagnaram ou retrocederam.
Os nilo-saarianos, apesar da retenção da cultura neolítica, expandiram-se para o sul, em território negro, onde a prática pastoril era competitiva, deixando até hoje sua marca com os masais, do Quênia, e os tutsis, do Burundi.
Mas a expansão dominante foi a das tribos negras do grupo banto em direção ao leste e ao sul, deslocando pigmeus e bosquímanos.
Essas ondas de invasão de tribos bantos continuaram até pouco antes do início de colonização européia no sul da África.
A progressão dos europeus para o norte se choca assim com o movimento natural das tribos de fala banto em direção ao sul. É esse conflito que está hoje na base das dificuldades políticas desse complexo país, a África do Sul.
Primeiro chegaram os bôeres, uma mistura de holandeses, belgas e franceses jacobinos que falam uma corruptela do holandês.
Em seguida vieram os ingleses, que empurraram os bôeres para o norte. Hoje há 2,5 milhões de descendentes de ingleses e 3 milhões de africânderes (os bôeres).
No século passado, trouxeram hindus como mão-de-obra provisória para as usinas de açúcar. Hoje há 1 milhão de hindus.
A região do Cabo era habitada por um povo gentil do grupo bosquímano, os hotentotes. Brancos, jamaicanos, malaios, hotentotes e negros (bantos) se mesclaram e hoje são 3 milhões de mestiços.
Duas grandes nações negras, a zulu (8,5 milhões) e a xhosa (8 milhões), ambas do grupo linguístico banto, completam o quadro.
O grande problema é que as barreiras raciais, senão racistas, se enrijeceram com o tempo e não parecem se amenizar nem mesmo nos grandes centros urbanos.
Casamentos
Africânderes não se casam nem sequer com ingleses, apesar da crescente evidência de que já há um significativo conteúdo negro em seu patrimônio genético.
O importante e profundamente negativo é que há divisões em classes que se atribuem características especiais relevantes, rigidamente estabelecidas, verdadeiras castas.
Não importa se são uma mera fantasia biológica ou não. O que é importante é que será sempre um impedimento à democracia e ao entendimento dos cidadãos.

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