São Paulo, quinta-feira, 13 de junho de 1996 |
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Ainda Dornbusch (1)
CELSO PINTO A tempestade provocada pelo economista Rudiger Dornbusch, do Massachusetts Institute of Technology (MIT), provocou mais ruído do que luzes -e não necessariamente por sua culpa. Como na brincadeira do "telefone sem fio", algumas de suas idéias iniciais foram tão embaralhadas no caminho que se tornaram irreconhecíveis.A maioria nem sequer se deu ao trabalho de discutir idéias. Entre outras coisas, Rudi foi acusado de: ser estrangeiro (um alemão que mora em Boston e fala sobre o Brasil!), cretino, doido, de se sentir rejeitado pela PUC do Rio (!!), improvisar análises para ficar rico, e até de ter uma ex-mulher trabalhando no Ministério da Fazenda (!!!). Bobagens à parte, o fato é que, um mês e meio depois de sua primeira entrevista, à Folha, ele continua sendo alvo de uma profusão de artigos e comentários. Por uma razão: como quase tudo o que faz, o que ele disse sobre o Brasil é polêmico, mas toca em algumas questões centrais, que meia dúzia de insultos não conseguem exorcizar. Duas delas: 1) o modelo de estabilização seguido pelo Brasil corre o risco (não imediato) de acabar numa crise cambial; 2) ele tem um custo, em termos de baixo crescimento, que poderia ser evitado com uma política cambial mais agressiva, ainda que às custas de uma inflação ligeiramente maior. Não é trivial comprar nenhum dos dois argumentos, mas vale a pena entender o que está por trás deles. Um artigo publicado ano passado, "Currency Crises and Collapses" (crises e colapsos monetários), escrito por ele junto com os economistas Ilan Goldfajn e Rodrigo Valdés, serve como base teórica de sua análise sobre o Brasil e a América Latina. O artigo defende quatro teses: 1) o câmbio é um preço-chave e, quando está supervalorizado, afeta o crescimento, cria instabilidade financeira e acaba em colapso; 2) o câmbio é uma variável de política econômica (o que contraria uma legião de economistas); 3) como é difícil medir qual é o câmbio "correto", os mercados de capitais acabam acomodando desajustes e, com isso, ampliando o colapso; e, 4) como é difícil acabar de vez com a inflação sem uma recessão, "um regime de inflação moderada, mas relativamente estável, é uma solução transitória aceitável, embora imperfeita". Para provar suas teses, o artigo examina quatro casos do uso do câmbio valorizado que levaram a desastres. O Chile de 1978 a 82, o México de 1978 a 82, a Finlândia de 1988 a 92 e, outra vez, o México de 1990 a 94. A sequência é conhecida: usa-se o câmbio, com sucesso, como âncora para conter os preços (barateando as importações); ele acaba sobrevalorizado (afetando as exportações); gera um déficit nas contas externas; os juros sobem para atrair dólares, a economia entra em recessão e o setor financeiro entra em crise (agravada pelos juros altos). O colapso não é imediato. O país pode estar realizando reformas, há dúvidas sobre a sobrevalorização, fatores externos parecem dar uma sobrevida, e os investidores internacionais continuam colocando (e ganhando) muito dinheiro. Nos quatro casos, contudo, o final também foi idêntico: um ataque especulativo destrói a moeda, há uma crise, recessão e volta da inflação. Tanto no caso do Chile quanto no da Finlândia (e, em parte, no do México em 94), a crise aconteceu apesar do bom desempenho fiscal. Esse, aliás, é um ponto interessante. É verdade que Dornbusch recomendou um ajuste fiscal decente para o Brasil, sem o qual seria inútil alterar o câmbio. A diferença entre esse discurso e o do governo é que Dornbusch acha que não basta o ajuste fiscal, sem mexer no câmbio. O artigo menciona, ainda, outros três exemplos de crises geradas pelo câmbio, mas com final feliz: Grã-Bretanha, Itália e Espanha. Ao entrarem no Sistema Monetário Europeu (SME), eles "engessaram" o valor de suas moedas ao marco alemão. A reunificação obrigou a Alemanha a elevar os juros, os outros países tiveram de acompanhá-la e entraram em recessão. Apesar do SME, os mercados atacaram essas moedas em 92 e forçaram sua desvalorização. Acabou sendo um alívio: os três países voltaram a crescer, sem maiores impactos inflacionários. Fica para a coluna de amanhã a avaliação crítica do câmbio e a questão do crescimento versus inflação. Texto Anterior: 'Tudo já foi regularizado' Próximo Texto: Contas do governo de SC são questionadas; Oposições fazem ato pró-greve em Brasília; Filhos de sem-terra morrem de diarréia; Administração de concessão da RFFSA será profissional Índice |
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