São Paulo, domingo, 16 de junho de 1996
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O "Who Is Who" de 1967

MARCELO MANSFIELD
ESPECIAL PARA A FOLHA

A turbulenta vida brasileira do pós-64 se viu entre a cruz e o diabo no período AI5, quando platéias de diferentes gostos se dividiam entre as calorosas e ufanistas sessões de Festivais da Canção e o "glamour" adolescente da Jovem Guarda.
Existia a repressão, mas existia a minissaia. Existia a "Disparada" de Geraldo Vandré, mas também Silvinha e "Feitiço Broto". Inocentemente, os títulos se confundiam. Será que "Eu Vou Botar prá Quebrar", da mesma Silvinha, teria a ver com algum quebra-quebra estudantil? E "É Proibido Fumar" teria algo a ver com o apito de algum guarda perdido na praia? Não. Ninguém pensou nisso. Só na diversão.
Dekalafe, a cantora descalça e de ar rebelde, pode não ter deixado em sua carreira, nenhuma música de que alguém se lembre a letra inteira, mas sem dúvida o tombo que a chupou para dentro do poço da orquestra do velho Teatro Record, é inesquecível.
Assim como o violão de Sergio Ricardo estraçalhado sobre o público. Mas qual de suas músicas estava sendo vaiada?
Em 1967, Françoise Dorleac, a irmã mais bonita de Catherine Deneuve, morria incendiada dentro de um Reanult, uma semana antes de Jayne Mansfield ser decapitada num Buick a 120 por hora. Wanderléa circulava num Cadillac a prova de balas, depois de ser ameaçada de sequestro, e Roberto Carlos chegava na "festa de arromba" com seu novo carrão. Erasmo Carlos tinha um Rolls Royce.
O mesmo RC viu um de seus inúmeros carros ser danificado por quase 10 mil fãs no seu aniversário anterior.
Em 1967, reuniu uma "lista de Ouro" da Jovem Guarda para comemorações: Erasmo, Martinha, Jorge Ben (antes do Jor), Os Vips e Demétrius.
Os quebra-quebras não aconteciam só entre a UNE e o governo, mas também entre este "circulo dourado": o mascote da jovem guarda, Ed Carlos, foi internado com suspeita de hemorragia interna, depois de ter levado uma surra de quatro rapazes por ser cabeludo.
Martinha, o "Queijinho de Minas", ficou ao seu lado no hospital. Aliás, Martinha era uma total desconhecida que, apenas seis meses depois de ser lançada pelo "Rei", já era uma estrela -com direito a todo o luxo que este pequeno grupo desfrutava.
Por luxo entenda-se festas gloriosas, carros último tipo e mansões de qualquer tamanho. Wanderley Cardoso, por exemplo, possuía um apartamento de 21 cômodos, com salas decoradas em estilo João Felipe e mobiliário Luiz 15.
Luminares menores podiam não desfrutar de tamanho prestígio e dinheiro, mas sem dúvida estavam longe de morrer de fome. Havia espaço para todo mundo nas tardes de domingo: às 16h30 era "Jovem Guarda" e às 18h, "Na Onda do Girassol", apresentado por Jerry Adriani, o rival carioca do rei Roberto, que num só programa, recebeu mais de 10 faixas de fã-clubes. Emilinha e Marlene que se cuidassem.
Os anos 70, mais duros e nada dourados, dariam um fim nessa brincadeira. Os reis do iê-iê-iê aos poucos foram deixando de lado seus calhambeques ao mesmo tempo que as garotas papo-firme que o Roberto falou, agora voltadas a nova mulher saída da revolução sexual, queimavam sutiãs da mesma maneira que se queimavam arquivos em Brasília.
O país mudava, os jovens se tornavam adultos, mas, por incrível que pareça, a TV não mudou tanto assim. Pegue sua caneta, e ligue as duas colunas, a lista dos "Dez Mais de Abril de 1967", e o que ainda está no ar, 29 anos depois.

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