São Paulo, domingo, 16 de junho de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Tarcísio Meira vive 'antigalã rural'

ELAINE GUERINI
DA REPORTAGEM LOCAL

Aos 60 anos, o eterno galã Tarcísio Meira dá um tempo nos papéis românticos e vive um fazendeiro rude e intolerante. Berdinazi, seu novo personagem, é um dos pivôs da disputa de terra que conduz a trama central de "O Rei do Gado".
O ator participa apenas da primeira fase da novela -quando Benedito Ruy Barbosa apresenta a origem da rivalidade entre duas famílias de imigrantes italianos: os Berdinazi e os Mezenga.
As famílias disputam uma faixa de terra localizada na divisa de suas fazendas de café. A situação esquenta ainda mais quando o velho Berdinazi descobre que sua filha está apaixonada pelo filho do seu maior inimigo, o Mezenga (Antonio Fagundes).
"O Berdinazi é um homem austero, seco e sistemático. O que não quer dizer que ele seja mau. Ele só não consegue mudar de idéia", diz Tarcísio -um dos atores que ajudou a implantar a telenovela no país.
Depois de estrear juntamente com o gênero em "2-5499 Ocupado" (1963), a primeira novela diária da TV, Tarcísio atuou em mais de 40 produções. "Não sei ao certo. Nunca contei."
Leia, a seguir, os principais trechos da entrevista com o ator, concedida em seu apartamento na Barra da Tijuca, no Rio.
*
Folha - Os personagens urbanos sempre predominaram em sua carreira. Como foi fazer o papel de um fazendeiro?
Tarcísio Meira - No início das novelas, nos anos 60, o Walter Avancini me disse que os personagens urbanos seriam mais adequados para mim. Eu fiquei com isso na cabeça, mas, ainda assim, fiz alguns papéis rurais ao longo da minha carreira.
Um deles com o próprio Avancini, em "Grande Sertão: Veredas" (85). Na verdade, acho que fiz mais personagens urbanos porque a TV produziu mais novelas urbanas. Só por isso.
Confesso que adorei fazer o Berdinazi. Ele é um homem rústico que, com muito custo, conseguiu seu próprio pedaço de terra. Eu pareço mais velho no papel. Precisei passar por mais de uma hora de maquiagem antes de cada gravação.
Folha - Como se sente ao ser apontado como um eterno galã?
Tarcísio - Como eu nunca me considerei um galã, não posso responder. Nunca me senti assim ou agi do jeito que as pessoas esperam que um galã faça. Fiz muitos personagens românticos, é verdade. Mas o Clint Eastwood é mais velho do que eu e ainda é considerado galã. É bonito ver um ator fazendo um papel romântico naquela idade. E, se ele faz, por que eu não posso fazer?
Folha - Acha que os atores mais velhos têm menos espaço?
Tarcísio - Isso não me preocupa. Acho que sempre haverá um bom papel para mim. Ao contrário de alguns colegas, eu gosto de fazer novelas. Gosto dessa convivência com um personagem vivo, que ainda está acontecendo. A cada dia, ele acrescenta coisas novas. É uma obra aberta.
Também tenho minha carreira como ator de teatro. Em agosto, eu e a Glória (Menezes, sua mulher) vamos estrear em São Paulo com a peça "E Continua Tudo Bem". O espetáculo é uma continuação de "Tudo Bem no Ano Que Vem", que nós encenamos há mais de 20 anos.
Folha - Como você vê sua participação na história da telenovela brasileira?
Tarcísio - Nesses 33 anos de carreira, fiz muitas novelas. Outro dia, conversando com o Denis Carvalho, cheguei à conclusão de que eu sou o homem que mais palavras decorou. Se eu me candidatasse ao Guinness, com certeza bateria o recorde.
Ninguém seria tão idiota a ponto de decorar inutilmente tanta coisa. Hoje em dia, a minha cabeça funciona assim: decorando e esquecendo. É um vai e vem. Esqueço coisas que eu não queria esquecer. Os meus neurônios foram educados nesse sentido. Foi uma maluquice. Devo ter decorado 80 mil páginas de texto.
Folha - Acha que a fórmula da novela está desgastada?
Tarcísio - As novelas ficaram supérfluas. Estão mais leves, divertidas e com apelo sensual. Mas o que leva o público a acompanhar uma história é a cumplicidade. E isso só acontece com o trabalho de poucos autores, como o Benedito, por exemplo.
Sua proposta é mais emocional, que vai fundo na sensibilidade dos espectadores. Sem isso, a obra é só entretenimento. Ultimamente, acho que temos tido poucas novelas de verdade.

Texto Anterior: Autor é dono de chácara e investe em gado
Próximo Texto: Brasileiro 'redescobre' atol de Bikini
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.