São Paulo, segunda-feira, 17 de junho de 1996
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Os reais limites da estabilização no Brasil

CLARICE MESSER SEIBEL; ENILCE LEITE MELO

CLARICE MESSER SEIBEL e ENILCE LEITE MELO
Não é novidade que o Plano Real esteja baseado numa política monetária rígida -com elevadas taxas de juros internas- e na valorização cambial desde julho de 1994, por ocasião da terceira etapa do processo de estabilização.
A concepção do plano levou ao estabelecimento de âncoras nominais (cambial e monetária), com a função de manter baixo o nível de preços por mecanismos artificiais, embora temporariamente.
O objetivo era garantir o tempo necessário para que se cumprissem as reformas estruturais, especialmente aquelas voltadas ao equacionamento fiscal e à redução do "custo Brasil".
Apenas com profundas mudanças no lado real da economia que contribuam para aumentar a produtividade da indústria nacional o país será capaz de garantir efetiva competitividade aos seus produtos, de modo a recolocar os mecanismos antes artificiais, como o câmbio, no seu devido patamar.
Após a crise do México -e mais consciente, portanto, dos pesados riscos de financiar déficits no balanço de pagamentos com capitais de curto prazo-, a equipe econômica passou a flexibilizar algumas condições iniciais do plano sem, contudo, abrir mão dos princípios básicos adotados.
Era preciso apontar no sentido do alargamento dos prazos de permanência do capital estrangeiro no país, o que foi feito por meio de mecanismos fiscais.
Se no último semestre de 94 o prazo médio de captação do setor privado era de quatro anos, à taxa de 12,04%, esse perfil mudou já em 95: o prazo médio de captação se elevou para seis anos e a taxa de juros caiu para 10,67%, sob um clima de maior confiança dos investidores estrangeiros no país.
Também era preciso garantir maior competitividade às exportações brasileiras nesse período de transição, por um lado, e proteger minimamente a indústria nacional, por outro, para que o esforço de estabilização não punisse irreversivelmente esses segmentos.
A correção paulatina do câmbio foi a opção utilizada, que tornou peculiar a política antiinflacionária no Brasil, "vis-à-vis" a praticada no México e Argentina.
Nesse sentido, desde janeiro de 1995, quando o Brasil registrou a mais alta valorização da taxa de câmbio em termos reais no período pós-real, de 22% em relação a julho/94 -com base no IPA-DI da FGV-, o que se observa é uma correção sistemática do câmbio ao longo do tempo. Isso fez com que a valorização cambial caísse, em abril de 1996, para algo em torno de 11%.
No âmbito da política monetária, a flexibilização dos compulsórios e a redução paulatina das taxas de juros é o que se persegue. No entanto, a ausência das reformas estruturais que complementariam a lógica do Plano Real agrava os efeitos da valorização cambial e do aperto monetário, que aparentemente se mostram maiores do que efetivamente são.
De qualquer forma, é necessário que não se perca a real dimensão dos problemas. A questão não é apenas cambial. Mexer no câmbio romperia a sequência do plano sem, contudo, atacar as deficiências existentes na economia brasileira -como o elevado "custo Brasil" e o desequilíbrio fiscal, entre outras. Essas, sim, colocam o país numa situação de desigualdade na competição externa.
Diante desse cenário, o que se percebe é que a situação econômica atual não é nem sequer a idealizada pelo governo; mas estamos longe de uma crise em decorrência de desequilíbrios cambiais.
A balança comercial de maio indica a possibilidade de saldo positivo no mês, com a divulgação do valor exportado de US$ 4,5 bilhões, superior aos demais meses do ano. O câmbio contratado registrou o forte superávit de US$ 3,7 bilhões, e as reservas cambiais devem chegar a quase US$ 60 bilhões neste mês.

Clarice Messer Seibel, 41, é diretora-executiva da Anecc (Associação Nacional de Empresas Credenciadas em Câmbio) e coordenadora do PNBE (Pensamento Nacional das Bases Empresariais).
Enilce Leite Melo, 30, é gerente do Departamento Técnico da Anecc.

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