São Paulo, quarta-feira, 19 de junho de 1996
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Carmen Mayrink Veiga é Madre Teresa tapuia

BARBARA GANCIA
COLUNISTA DA FOLHA

Só se fala em outra coisa, digo, só se fala nela: Carmen Mayrink Veiga, a divisora de águas. De hoje em diante o mundo está dividido entre quem leu e quem não as declarações contundentes da socialite que perdeu seu Rolls para o senador Gilberto Miranda.
Aliás, minha vida agora se divide entre antes e depois de ler a tal entrevista na revista semanal. O privilégio de saber como pensa a grande dama do society carioca me transformou, da noite para o dia, em um ser espiritualizado.
A mulher é iluminada. Compreende como poucos o espírito do seu tempo e comove com o relato do drama da família, que depois de perder toda a bufunfa se viu sem poder mais andar de concorde, ir à Londres só para um vernissage ou vestir alta costura. O sofrimento humano não tem limites.
Agora que está na pindaíba, Carmen usa um "Rolex banal, que todo mundo tem". Claro, no mundo, segundo Carmen Mayrink Veiga, todas as avenidas são a avenue Foch, não existe lugar para as Santo Amaros da vida. Só seres de espírito elevado conseguem ter essa visão benevolente de um mundo que nós mortais costumamos considerar tão vil.
Alta sociedade para ela é "um grupo de pessoas que leva uma vida calma e tranquila. A gente vai a um jantarzinho na casa de amigos, às vezes janta fora, e todo mundo sai bem-arrumado". E eu, belzebu, que achava que alta sociedade era aquela rede de intrigas povoada por decoradores, peruas e trapaceiros que não fazem outra coisa na vida senão levar de Londres para Paris, de Paris para Nova York, de Nova York para Mustique, de Mustique para Deauville fofocas e perfídias sobre seus pares? Como pude ser tão cruel?
E quando a Carmen diz que tudo o que lhe restou o banco não pode tomar porque são presentes ganhos do sogro, da mãe e do marido? "Toda mulher, em qualquer ocasião, ganha um presentinho". Ela não é uma fofa abençoada por Deus? Eu, por exemplo, nunca ganhei Rolls-Royce "marrom glacê" para passear em Paris. A Carmen sim e merece. Merece um paraíso povoado de jantarzinhos com lugar marcado, comentários sobre a foto na coluna social e lugares na primeira fila dos desfiles de Paris. Meu desejo é que ela vá para esse paraíso de primeira classe, carregando nas costas um saco de paralelepípedos.

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