São Paulo, domingo, 23 de junho de 1996
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Cofap e Mahle farão nova megaempresa

CELSO PINTO
COLUNISTA DA FOLHA

Ao comprar a Metal Leve, os acionistas da Cofap tomaram outras duas decisões de peso para seu futuro: formar uma nova empresa com a alemã Mahle e fixar uma data -11 de julho de 1997- para a saída de Abraham Kasinski da presidência executiva do grupo. Nesse dia, ele fará 80 anos.
Tanto a compra da Metal Leve quanto a saída de Kasinski deverão ser ratificadas amanhã, numa assembléia geral de acionistas da Cofap. Na prática, já estão asseguradas por meio de um novo acordo entre os acionistas principais da Cofap, alinhavado junto com a compra da Metal Leve.
Abraham Kasinski, filho do fundador da Cofap e grande responsável por torná-la a maior indústria de autopeças da América Latina, com faturamento de R$ 732 milhões em 97, tem hoje 11% do capital da Cofap. Seus sobrinhos têm 40%, e o Bradesco, outros 40%.
Durante algum tempo, o controle da Cofap esteve abalado por uma disputa entre Kasinski e seus dois filhos, a quem ele havia doado 51% das ações da empresa, mas não o usufruto. A briga foi finalmente resolvida em setembro passado, quando Kasinski recomprou os 51% das ações, vendendo 40% para o Bradesco e ficando com 11%. Outros 40% ficaram nas mãos de seus sobrinhos.
Plano quinquenal
Esse acerto, que deveria ter durado dois anos, não funcionou em função de novas divergências. Um novo acordo, firmado junto com a compra da Metal Leve, e que deverá durar cinco anos, determina que Kasinski ficará todo o período na presidência do Conselho de Administração.
A idéia é completar a profissionalização da gestão da empresa. As decisões serão tomadas por maioria simples, o que significa várias possibilidades de alianças entre os três blocos de acionistas.
Caberá a Kasinski completar o acerto com a Mahle para formação do que ele chama de uma megaholding, formada pelas fábricas de anéis de pistão da Cofap no Brasil e em Portugal, quatro fábricas de pistões da Mahle na Espanha, duas na Itália e uma no Brasil, além da própria Metal Leve. Na Metal Leve, a Mahle entrou com 50% do capital, a Cofap com 33% e o Bradesco, com 15%.
Ponta do iceberg
A compra da Metal Leve é apenas parte da operação. Kasinski diz que há um contrato assinado com a Mahle prevendo a formação da megaholding em 12 meses. Se não der certo, o negócio da Metal Leve será redividido meio a meio.
Kasinski, contudo, aposta no sucesso. A Mahle já é a maior fabricante de pistões do mundo. Junto com a Cofap, terceira maior fabricante mundial de anéis, e a Metal Leve, a nova empresa ficará numa posição privilegiada para fornecer kits completos para motores, na forma e na escala que as montadoras em todo mundo exigem.
Negócio modelar
Essa escala, diz Kasinski, é indispensável num mundo globalizado: ele prevê que, em um ano, não será mais viável fabricar motores no Brasil. Associado à Mahle, Kasinski espera que, em pouco anos, a nova holding fature tanto quanto todo o grupo Cofap este ano, algo em torno de US$ 800 milhões.
A Cofap não desaparece. Ao contrário, a área de anéis representa apenas 28% do faturamento da Cofap -e é apenas essa área que fará parte do acordo com a Mahle.
O modelo de associação nessa área poderá acabar inspirando outras associações futuras. A Cofap é muito forte, por exemplo, na área de suspensão, que representa 39% de seu faturamento. A Cofap, em co-design com a Fiat, ganhou a plataforma 178 da Fiat para fabricação do Palio. Com isso, onde quer que o Palio seja produzido, sua suspensão será Cofap.
Mesmas mãos
Essa tendência a associações parece inevitável no setor de autopeças, a partir das exigências das montadoras de comprar conjuntos montados, em qualquer lugar do mundo, em enorme escala e preços baixos. A Cofap já tem, por exemplo, associados na montagem de eixos dianteiros. O grupo é forte também em escapamentos, uma área responsável por 14% de seu faturamento, outra candidata a um fortalecimento externo.
Kasinski assegura, contudo, que não há qualquer intenção da Cofap de mudar de mãos. O grupo teve prejuízo de R$ 17 milhões em 95, mas, segundo Kasinski, acumulou lucro de R$ 7 milhões no primeiro quadrimestre deste ano. Além disso, teria R$ 58 milhões em caixa.
Interesse alemão
Neste sentido, sua situação é diferente da Metal Leve, que, faturando a metade da Cofap, teve R$ 19 milhões de prejuízo em 95 e perdeu mais R$ 10 milhões no primeiro trimestre, segundo Kasinski.
No mercado, muitos entenderam o fato de a Mahle se associar à Cofap para comprar a Metal Leve como um primeiro passo para a compra da própria Cofap. O fato, contudo, é que a parte do grupo Cofap que faz mais sentido, do ponto de vista da sinergia com a Mahle, é exatamente o de anéis, que comporá a megaholding.
Existem boas razões para o interesse dos alemães. A segunda maior produtora de pistões no mundo, abaixo da Mahle, é a TNN, uma empresa britânica que em 95 comprou a Goetze, concorrente da Mahle. Diante desse passo, restou à Mahle pensar numa associação com a terceira maior produtora, a Cofap.
A primeira vez que a Cofap procurou a Mahle, lembra Kasinski, foi há um ano e meio, com a proposta de juntar as fábricas de camisas de cilindro -uma área que, ironicamente, acabou excluída da associação final. A discussão entre os dois empacou, interpreta Kasinski, pelo temor das equipes dos dois lados: dos brasileiros, por medo de serem engolidos pela tecnologia alemã; dos alemães, pela escala maior de produção dos brasileiros.
O novo impulso foi dado com a ida de Kasinski à Alemanha, há três meses. Daí começou a surgir o projeto de unir a área de pistões e anéis. A entrada do Bradesco, que tem participação tanto na Metal Leve quanto na Cofap, ao propor negócio com a Metal Leve, acabou levando à fórmula tripartite.
O acerto final do negócio da Metal Leve se dará no dia 28. A administração da nova Metal Leve já tem seu formato definido.
Não haverá uma presidência formal e sim três diretorias executivas: de produção, comercial e financeira. Kasinski diz que o diretor de produção será nomeado pela Mahle, ele ficará com a diretoria comercial e a financeira ainda será decidida, certamente com a participação do Bradesco na decisão.
Último obstáculo
Kasinski está otimista com a Metal Leve. Acha que só com a economia na redução da diretoria (eram 27 acionistas que tinham cargos) e a racionalização da produção, será possível lucrar ainda este ano.
O último obstáculo a vencer no caso da Metal Leve é o Cade, que examinará se a compra da Metal Leve não levará a uma concentração inaceitável do setor.

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