São Paulo, sexta-feira, 28 de junho de 1996
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A segunda investigação

JANIO DE FREITAS

É óbvio que a decisão do ministro Nelson Jobim, fazendo a Polícia Federal intervir nas investigações em Alagoas, nada tem a ver com o artigo aqui publicado, também anteontem, sobre o dever federal de intervenção antes que fossem eliminados os últimos vestígios do crime. Não há cabotinismo nem autopromoção, portanto, em considerar que afinal alguém fez algo certo em relação ao assassinato de PC Farias.
É necessário observar-se, no entanto, que a intervenção da PF não decorre só dos procedimentos exóticos ou suspeitos da polícia alagoana. Fator de igual, senão de maior relevância, é a infinita omissão do governador Divaldo Suruagy. Escafedeu-se como se o crime fosse em outro Estado. E como se o espetáculo da polícia tresloucada não se desse na sua Secretaria de Segurança, estrelado pelas principais figuras para ela nomeados pelo governador.
Divaldo Suruagy deixou a impressão de que não é governador, mas refém. E, em tal condição, incapacitado para deter a desmoralização do Estado e do governo, impondo rigor à conduta dos subordinados ou substituindo-os de imediato. Caso sejam irrecuperáveis elementos essenciais ao esclarecimento do que houve em torno de PC Farias, a imagem de seriedade de Divaldo Suruagy também será irrecuperável.
A esta altura, a missão explícita da equipe mandada a Maceió por Jobim está é inseparável de outra, não mencionada. Consiste esta em desvendar os motivos da conduta adotada pelas principais personagens do dispositivo policial alagoano. Os erros já apontados por especialistas, e muitos percebidos até pelos leigos, podem ter como causa a incapacidade técnica, vá lá que seja. Mas houve atos que não podem ser considerados erros. Mais parecem resultantes da intenção de enganar mesmo.
São coisas mais simples, porém não menos intrigantes do que os problemas periciais já postos em questão. Sabe-se, por exemplo, que não foi permitido o acesso de repórteres e fotógrafos ao quarto onde estavam os corpos. Mas não se sabe por que a cena lhes foi descrita, para divulgação, cheia de falsidades: PC Farias tinha na mesa de cabeceira um litro de uísque Logan e uma garrafa de Perrier, o revólver estava entre as pernas da moça, e na versão inicial era um Taurus 38. As fotos da própria polícia, obtidas e divulgadas pelo professor George Sanguinetti, desmentem o uísque, a Perrier e a localização do revólver. E o Taurus, desde que foi o caso de ligar a moça à posse da arma, transfigurou-se em Rossi 38. As posições dos corpos fotografados não coincidem, também, com a descrição feita pela polícia para os repórteres.
O motivo de toda esta adulteração é tão misterioso quanto o próprio crime. E os chefes da polícia alagoana não deram oportunidade, até agora, para supor-se que as descrições fantasiosas foram apenas leviandades. Ao invés disso, deram todos os motivos para entender-se que mereçam investigação. Assim como no esquema Collor-PC não havia gratuidade, tudo tinha um preço, no episódio final de Paulo César Farias nada terá sido gratuito.

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