São Paulo, quinta-feira, 4 de julho de 1996
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Caçando fantasmas

MOACYR SCLIAR

Os dois eram políticos, os dois estavam sem programa -mas os dois tinham lido a Folha, o que pelo menos ajudava a superar a falta de assunto.
- Você viu que coisa fantástica esse negócio dos caça-fantasmas na Câmara Municipal de São Paulo?
- Fantástica mesmo -disse o segundo. Aliás, eu sempre achei que tem muito fantasma solto neste país. Fantasma em Câmara de Vereadores, fantasma na Comissão de Orçamento... Emprego para caça-fantasma aqui não falta.
- É uma medida de impacto, essa, hein? Uma medida de impacto. É a ciência aplicada à administração pública. A parapsicologia a serviço da população. Francamente, creio que com isso o nosso país assume um papel de vanguarda. Porque em outros lugares existem caça-fantasmas -os americanos fizeram até um filme sobre esse assunto-, mas em nenhum lugar houve uma iniciativa organizada nesse sentido. Nós vamos passar para a história, você vai ver. O segundo continuava ruminando seus pensamentos:
- É, caça-fantasmas. Muito bom, isso. Por que não usar no caso PC? Uma entrevista com o fantasma dele poderia esclarecer muita coisa, e não só em relação ao crime. Quem mexia naquelas verbas todas do tempo do Collor? Quem estava interessado no silêncio do PC? Sim, um caça-fantasmas poderia obter todas essas respostas, e mais algumas.
Fez-se um silêncio.
- Você falou no PC Farias? -perguntou o primeiro.
- Falei. Não é ele o fantasma mais importante neste país?
- É.
- Então? Por que não mandar um caça-fantasmas atrás dele?
Novo silêncio.
- Pensando bem -disse o primeiro-, melhor deixar de lado essa história de caça-fantasmas. Você sabe, mexer com fantasmas é muito perigoso. Muito perigoso.

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