São Paulo, segunda-feira, 8 de julho de 1996
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Pequenas e saudáveis formigas

EDEMAR CID FERREIRA

Aos olhos da opinião pública, uma nuvem negra parece pairar sobre os bancos brasileiros. Trata-se, porém, de uma imagem enganosa.
O Brasil de moeda estável é um excelente mercado para a atividade bancária, menos arriscado do que foi o Brasil da inflação galopante. Apenas trata-se de um mercado diferente.
A origem do engano, e da percepção de que os bancos estão em crise profunda e insuperável, encontra-se, naturalmente, nos raios que fulminaram algumas instituições muito conhecidas, com intervenções e liquidações. Os raios, porém, não eram o prenúncio do dilúvio.
Evidentemente, a brusca desaceleração da inflação pegou de surpresa empresas ineficientes e com custos elevados, subitamente privadas dos seus ganhos inflacionários.
A derrocada das taxas inflacionárias provocou uma imensa mudança no ambiente dos negócios financeiros. Como um tecido vivo, que se renova, o mercado apresenta e provavelmente ainda apresentará alterações -células cheias de vida que tomam o lugar do tecido esgotado.
Muita coisa nova acontece atualmente no sistema bancário, em todo o mundo, e este movimento está quase sempre associado a colapsos e prejuízos, como aconteceu nos Estados Unidos, com as empresas de "saving & loans" (S&L), no Japão, com as companhias de financiamentos imobiliários ("jusen"), no Reino Unido, com o banco Barings, na França, com o Crédit Lyonnais, na Itália, com o Banco di Napoli.
No Brasil, apesar do frenesi que às vezes percorre o mercado e cria assunto para conversas de botequim, pode-se garantir que o setor financeiro não está atolado em um pântano de dificuldades. E que o Banco Central atua de forma competente para assegurar que isso jamais ocorra.
Bancos grandes, médios e pequenos estão saudáveis e vão muito bem em nosso país pela simples razão de que há lugar e bons negócios para todos -todos os que querem trabalhar, bem entendido, porque o que entrou em crise, e dela não sairá, foi o método indolente e desleixado de ganhar dinheiro com banco em clima de alta inflação.
Na verdade, uma das mais pérfidas consequências do turbilhão inflacionário, na área financeira, foi confundir cigarras e formigas, para utilizar a imagem que o velho sábio Esopo criou, seis séculos antes de Cristo. Antes do real -e por muitos anos-, o alarde das cigarras muitas vezes encobriu o trabalho cotidiano e paciente das formigas.
A eliminação do confisco inflacionário, que depredava a renda do assalariado e, tão docemente, perdoava os erros e a desídia dos "rentiers", acabou com a festa do eterno verão para uns pouquíssimos e inverno permanente para muitíssimos.
Os efeitos do plano de estabilização para o mundo financeiro não se restringiram à extinção do lucro fácil. O rigor da política monetária, posta em prática para ancorar o real, confiscou a liquidez e assim atingiu diretamente os bancos.
As taxas reais de juro, por seu lado, alavancadas pela "cunha" dos depósitos compulsórios, levaram à inadimplência pessoas físicas e empresas -e isso também alvejou os bancos, agora mais dependentes de operações de crédito para gerar receitas. Em outras palavras, a vida tornou-se mais difícil, a responsabilidade ficou maior.
Mas novas oportunidades surgiram. O dinheiro está mudando de mãos, e isso tem um grande significado para quem opera profissionalmente com dinheiro.
Bancos que não perderam o foco e não abandonaram a vocação tradicional da sua atividade, com as suas regras fundamentais e procedimentos de praxe, bancos que sabem ser parceiros dos seus clientes e sabem atendê-los com flexibilidade e criatividade estão saudavelmente preparados para uma nova etapa de crescimento, como não poderia deixar de acontecer em uma economia tão dinâmica quanto a brasileira, em um mercado que confia no crédito como alavanca para o desenvolvimento e está altamente familiarizado com a sua utilização.
Não existe uma fórmula mágica de sucesso, porém é certo que nenhum estabelecimento de crédito chegará a ele se não fizer um combate diário pela diminuição dos seus custos e não certificar-se cotidianamente da precisão do seu foco.
Para essas instituições e para os seus clientes, inflação baixa e juros decrescentes são excelentes notícias.
Apesar das nuvens que possam parecer pairar, este é o clima no qual prosperam as atividades bancárias neste Brasil de tanta variedade e tantas esperanças. Nenhum espectro ronda o nosso sistema financeiro.

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