São Paulo, quinta-feira, 11 de julho de 1996
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"Um Céu de Estrelas" tem as marcas da nova dramaturgia

NELSON DE SÁ
DA REPORTAGEM LOCAL

"Um Céu de Estrelas" vem com as marcas da nova dramaturgia, de fato.
Tem ecos dos autores brasileiros Pedro Vicente e Bosco Brasil, para não falar de Patrícia Melo; ecos também do falecido francês Bernard-Marie Kolts, revelado aqui por Beatriz Azevedo, ou do canadense Brad Fraser, do britânico Jez Butterworth, dos americanos Howard Korder e Anna Deavere Smith.
A violência opressiva, cercada, urbana; o realismo; a ironia no diálogo, o humor no terror e na morte; aqui e ali, fé, Deus como saída.
Com a fórmula toda em dia, "Um Céu de Estrelas", pelo menos na estréia, na Jornada Sesc, não funcionou -como "Natural Born Killers" não funcionou, diante de "Reservoir Dogs".
E não faltam grandes atores. Ney Piacentini e Luan Guimarães atingem na montagem um amadurecimento de interpretação inesperado.
Piacentini com um tempo de comédia, um "timing" preciso, redondo. Luan Guimarães com uma sensualidade e uma paixão arrebatadoras, como em espetáculos neo-românticos recentes tipo "I Love" ou "Violeta Vita".
Mas a dramaturgia, logo a dramaturgia!, pedia maior cuidado. Acreditar em novo drama com uma peça de sala de estar, com sofá no centro do palco; com sexo simulado, de novela, ou do pior cinema. E quem explica a polícia? De onde vem? Por que vem?
O enredo: Ney Piacentini invade a casa da ex-noiva, Luan Guimarães, que o deixou, e a estupra -ou algo próximo- depois de matar a mãe dela. Por fim, se vê cercado pela polícia.
Polícia que chega do nada, em golpe de teatro, dizendo saber bem que é o personagem de Piacentini; mais à frente, anuncia-se que ele não tem antecedentes.
A inverossimilhança, que vinha ganhando forma, no sexo simulado com direito a "escurinho", nas personagens paralelas sem definição (mãe, vizinha), na ambiência falseada (a Mooca, mas poderia ser a Vila Madalena, ou os Jardins, o Bronx...), toma conta e a peça adentra pela farsa -com direito a intervenções da platéia, como em alguma sala de cursinho.
Inverossimilhança, aliás, que parece ser qualidade crônica da literatura urbana fundada no Brasil por Rubem Fonseca.
Não que "Um Céu de Estrelas", de Lígia Cortez, deixe de ter as suas qualidades reais. O diálogo tenso a cada palavra, irônico a cada imagem; o desenho dos dois personagens centrais.
Mas é pouco, em carpintaria, em arte, para quem, na verdade, não tem mais a desculpa do risco, do novo.

Festival: Jornada Sesc de Teatro
Hoje: "Eídolon", de Solange Dias (às 21h)
Onde: teatro Sesc Anchieta (r. Dr. Vila Nova, 245, Consolação, tel. 011/256-2281)
Quanto: R$ 6 (R$ 3 para comerciários e estudantes)

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