São Paulo, domingo, 14 de julho de 1996 |
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Ah, que delícia de privatização
ALOYSIO BIONDI Na semana passada, o governo da França concluiu a privatização de sua gigantesca empresa de seguros, uma das maiores do mundo. Foram vendidos US$ 2 bilhões, em ações. A poucos grupos, como no Brasil? Com empréstimos do próprio governo, por meio de seus bancos oficiais? Não. Quase 1 milhão de franceses viraram acionistas da empresa, com a compra direta das ações -sem contar outros milhões que têm seu dinheiro em fundos de investimentos, compradores do papel.No balanço final, o povo francês ficou com 65% das ações. Em todo o mundo vem sendo assim: quando a sociedade decide privatizar, os governantes procuram "dividir" o patrimônio da estatal entre o maior número possível de cidadãos. Adotam, os governantes estrangeiros, medidas para evitar que a propriedade e a renda se concentrem em poucas mãos -pois quando isso ocorre a sociedade se "racha" em dois grupos desiguais. De um lado, uma minoria cada vez mais bilionária, e, de outro, empresários em geral e classe média empobrecidos, juntamente com um povão cada vez mais miserável. Para obter a adesão maciça à compra de ações, os governantes de outros países criam estímulos -e, principalmente, divulgam informações corretas sobre a futura lucratividade do negócio. No Brasil, tudo está acontecendo ao contrário da tendência mundial. De Telebrás à Vale, da concessão para exploração de rodovias à construção de estações de metrô, é uma sucessão de negócios indecorosos. Em lugar de falarem em nova greve geral, por que as lideranças sindicais, junto com entidades como a OAB, não mobilizaram a população contra esse processo de assalto ao patrimônio dos contribuintes? Seguem-se "casos" dos últimos 15 dias. O caso Telebrás As ações da Telebrás subiram 80% neste ano. Motivo da disparada: grandes lucros da estatal, que vai ser privatizada. Origem do lucro? Reajuste das tarifas. O lucro era previsível, a população deveria ter sido informada. Por desinformação, milhões de brasileiros venderam ações da estatal (recebidas, no passado, na compra de telefones dos planos de expansão). Vale ouro Calcula-se que somente as reservas de metais já "medidas" pertencentes à Vale do Rio Doce tenham um valor de US$ 40 bilhões. O governo prepara sua privatização. Por quanto? Por US$ 3 bilhões, que um grupo de empresas pagaria por 45% das ações com direito a voto e passaria a ser dono da Vale. Como é mesmo? Solenemente, o próprio presidente da República assinou contratos de empréstimos internacionais para duplicar a BR-101, de São Paulo a Florianópolis. Quanto o Tesouro vai gastar: R$ 1,3 bilhão. Na solenidade, o ministro dos Transportes anunciou que a rodovia será privatizada. Quando as obras forem concluídas. Aí, os empresários investirão. Quanto? R$ 100 milhões... Nem na China O governo paulista foi impecável na privatização da rodovia Bandeirantes/Anhanguera. Mas escorregou feio na retomada da linha norte do metrô. O governo paulista já gastou R$ 200 milhões e vai aplicar mais R$ 130 milhões, totalizando R$ 330 milhões. Três empresas privadas vão gastar R$ 90 milhões na construção de três estações -e ficar com toda a receita das passagens, por 15 anos. Faturarão no mínimo R$ 3 milhões por mês. Ou R$ 35 milhões por ano. Os passageiros, obviamente, usarão toda a rede do metrô -em que o Estado investiu bilhões. Texto Anterior: CEF aplica mais 3% às prestações Próximo Texto: São Paulo Índice |
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