São Paulo, sexta-feira, 19 de julho de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Judoca faz molecagens antes da 'decisão'

MARCOS AUGUSTO GONÇALVES
DO ENVIADO A ATLANTA

"Você quer comprar um tênis?", pergunta Edinanci ao caminharmos em direção à casa onde receberá a notícia oficial da aprovação de seu teste de feminilidade.
"Talvez, qual é o número? É novo? Você pode me mostrar?", pergunto. "Só mostro se você disser que compra", responde com um sorriso irônico.
Pouco antes, ela me havia vencido numa partida de pingue-pongue, no salão de jogos do alojamento, onde a judoca Tânia Ferreira improvisara um cabeleireiro. "Vem cortar, Edinanci", convidou, sem sucesso.
Tensa e lacônica na hora de responder perguntas formais, Edinanci solta-se no salão de jogos.
Faz molecagens, fala bobagens, não parece nem um pouco preocupada com a transformação de sua sexualidade em assunto público internacional.
"Não ligo, não", diz, com uma ponta de sotaque paraibano. Tanto que, ao saber que estava sendo convocada para vestir o uniforme do COB e se apresentar na casa da chefia da delegação, preferiu terminar a partida recém-iniciada: "Vamos continuar, não vai ter problema não".
Continuamos e, logo, vem outro aviso. Novamente ela se recusa a parar. "Vamos acabar, deixa os cartolas para lá", diz bem-humorada. Quando faltam dois pontos para o fim, me faz uma pergunta inesperada: "Está feliz?"
Respondo que sim, esperando alguma piada de troco. Não vem.
Ela fecha o jogo em 11 x 9 e diz que aprendeu a jogar com o amigo Cláudio Kano, morto recentemente num acidente de moto, antes de embarcar para a Olimpíada.
Abandonamos o salão de jogos, ela passa por seu quarto, põe o uniforme e saímos caminhando em direção à casa, onde é aguardada pelos "cartolas" e por uma câmera da Rede Globo.
Prosseguimos a caminhada e, pouco antes de chegarmos, recebo a notícia de sua aprovação por celular. Conto a novidade.
Ela diz que o resultado "era consequência" e entra na sala, onde é recepcionada pela comitiva oficial.
Pouco depois, sai pelos jardins do alojamento para comemorar com as colegas. "Agora vou até cortar cabelo", decide.
A primeira luta foi vencida. Amanhã é para valer.
(MAG)

Texto Anterior: Edinanci muda visual e comemora sua 'aprovação'
Próximo Texto: Fim do amadorismo
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.