São Paulo, domingo, 21 de julho de 1996
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Estratégia de um dissidente

CÁSSIO STARLING CARLOS
EDITOR-ADJUNTO DO MAIS!

A obra do escritor cubano Reinaldo Arenas (1943-1990) é uma transfiguração para o plano literário e pessoal da história de seu país nos últimos 40 anos.
Arenas nasceu na isolada Província de Oriente. Chegou a Havana logo após a Revolução Cubana, no fim dos anos 50. Começou a escrever depois da invasão da Baía dos Porcos, pelos EUA, em 1961.
Mesmo para aqueles que conhecem a explosiva autobiografia "Antes que Anoiteça" (1990) e a sátira sobre a liberdade nos EUA em "O Porteiro" (1986), os dois relatos que compõem "A Velha Rosa" são exemplares da estratégia de Arenas de fazer da matéria literária uma forma de liberação.
O primeiro conto, que dá título ao volume, foi escrito em 1964, e o outro, "Arturo, a Estrela Mais Brilhante", em 1971. Entre os dois, por ter publicado sem autorização fora de Cuba e por ser homossexual, Arenas passou a ser perseguido pelo regime de Fidel. "Arturo" foi escrito na prisão. Em 1984, ele se exilaria nos EUA, onde se suicidou em estágio terminal de Aids.
As duas histórias se complementam, e as diferenças de construção atestam as mudanças na vida do escritor. O primeiro conto possui estrutura linear e descrição naturalista. O segundo é uma sequência estritamente subjetiva.
Em "A Velha Rosa", Arenas narra a vida de uma mulher do campo que se nega a entregar sua fazenda quando começa o processo de coletivização. Neste conto, Arenas elabora um universo (inspirado em sua memória familiar) em que as forças da cultura e da natureza -o sexo, a política, o trabalho, a terra- se enfrentam.
Já "Arturo" é um relato que abstrai os eventos, uma série de pensamentos e imagens que fluem da imaginação de um escritor prisioneiro em um campo de trabalhos forçados. Da imaginação ele extrai o material para constituir um mundo paralelo que permita subtrair-se da rudeza da prisão. Arenas abole a pontuação e expande a sintaxe a fim de criar na própria escrita uma linha de fuga.
Como escreve em "Arturo", "à imagem que se padece deve ser anteposta, real, a imagem que se deseja, não como imagem, mas como algo verdadeiro, que se possa desfrutar...".
Em "A Velha Rosa", Arenas exibe como triunfo sua verdade.

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