São Paulo, segunda-feira, 29 de julho de 1996
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Lampião queria abandonar o cangaço

ARI CIPOLA
DA AGÊNCIA FOLHA, EM MACEIÓ

Virgulino Ferreira da Silva, o Lampião, havia decidido abandonar o cangaço e migrar para Minas Gerais quando foi emboscado e morto na Gruta do Angico, no sertão sergipano, pela volante (polícia) alagoana.
A afirmação é do cangaceiro e amigo de Lampião, Manoel Dantas Loyola, 82. Candeeiro, como Loyola era chamado, é um dos dois únicos cangaceiros que participaram do episódio de Angico e que está vivo. Ontem fez 58 anos da morte de Lampião.
A revelação do cangaceiro traz a polêmica que será, ao lado da velha discussão sobre se Lampião era herói ou bandido, um dos centros dos debates acadêmicos no centenário do nascimento do cangaceiro pernambucano, que será comemorado no próximo ano.
Candeeiro era um homem de elite do grupo de Lampião. Saiu vivo da emboscada de Angico, no município de Poço Redondo (SE), mas com um tiro no braço direito.
Teve mais sorte que Lampião e sua mulher, Maria Bonita, e outros nove cangaceiros que morreram no confronto e tiveram suas cabeças expostas nas escadarias da prefeitura de Piranhas (AL).
Ele voltou ao local da emboscada há oito dias para se encontrar com José Panta Godoy, 83, o cabo Panta, que disparou os dois tiros que mataram Maria Bonita.
O encontro foi promovido pela Chesf (Companhia Hidrelétrica do São Francisco), que quer desenvolver o turismo na região da Hidrelétrica de Xingó, que fica a sete quilômetros do local onde Lampião morreu.
Cerca de quatro meses antes de morrer, segundo Candeeiro, Lampião reuniu os 22 cangaceiros que estavam mais próximos dele, em Delmiro Gouveia (AL), e comunicou que faria "a viagem longa".
O historiador da Fundação Joaquim Nabuco de Recife (PE), Frederico Pernambucano de Mello, 48, autor de dois livros sobre o cangaço, acompanhou o encontro de Candeeiro com o Cabo Panta e disse que as revelações do cangaceiro fazem sentido.
Mello está investigando a possibilidade de Lampião ter fechado um acordo com os líderes das três volantes alagoanas que o seguiam para abandonar a região.
Candeeiro afirma que Lampião deixaria o cangaço porque considerava que a região "estava esgotada", já estava rico e com sua mobilidade reduzida. Lampião vagava por sete Estados nordestinos e nos últimos meses seu mundo estava reduzido a refúgios em quatro fazendas, diz Mello.
"Para onde me volto encontro amigos. Se ficar aqui vou ter que atacar os amigos", teria dito Lampião a Candeeiro e os outros cangaceiros quando começou a articular sua mudança para Minas Gerais.

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