São Paulo, terça-feira, 6 de agosto de 1996
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Uma medalha com vergonha

MATINAS SUZUKI JR.
EDITOR-EXECUTIVO

Meus amigos, meus inimigos:
1) Se medalha olímpica é critério, o esporte realmente decolou no Brasil. As medalhas mostram que o país tem embocadura para a coisa.
2) Comparado com os irmãos de plano de estabilização, Argentina (duas pratas e um bronze) e México (um bronze), foi um banho.
3) Mas a Ucrânia (nove), a Coréia do Sul, a Polônia, a Hungria (sete), a Romênia, a Grécia, a República Tcheca e até a Turquia (quatro), estão entre os países que tiveram mais ouro do que o Brasil.
E Cazaquistão, Nova Zelândia, África do Sul e Irlanda conquistaram o mesmo número dourado.
O recado é: no pente-finíssimo do ouro que é bom e a gente gosta, ainda falta lastro para garantir o estágio de potência esportiva.
4) Vale lembrar: as três medalhas de ouro do Brasil saíram do vôlei de praia, que não tem tradição olímpica, e do iatismo (que sempre cavou a sua medalhinha).
Pouco avanço no topo do pódio.
5) Memorando: o Brasil tem doze medalhas de ouro em cem anos de jogos. A Coréia do Sul, 42.
6) Sei que o índice de produtividade não é critério exclusivo. Mas é importante para um país avaliar se os seus investimentos no esporte estão dando resultados.
É neste critério que se vê, claramente, que ganhar muitas medalhas requer muito investimento.
A China é mais produtiva que os EUA, no esporte.
7) Neste critério eficiência, o Brasil despenca do 25º para o 43º lugar, uma vez que o país faturou mais medalhas, mas também levou mais atletas a Atlanta.
8) Em 92, com três medalhas, o Brasil ficou em 25º lugar. Agora, com 15 medalhas, o Brasil continua no mesmíssimo 25º lugar.
O Brasil melhorou e ficou na mesma. Melhorou, porque conseguiu real competitividade em esportes que não disputava medalha.
E ficou na mesma porque a geopolítica esportiva abriu espaço para novas nações, quebrando a hegemonia de dois blocos que tiravam o espaço de todo o resto.
9) Como se previu aqui, há uma tendência para a redistribuição mundial da cesta de medalhas.
O século que vem será o de uma nova era no esporte. Pelo jeito, o Brasil já começa a colocar o seu pezinho no ano 2000.
9) Um outro fator pesará globalmente: estamos vivendo a era da crise das finanças públicas.
Esta crise, aliada à fragilidade dos Estados chamados de comunistas, que inflavam artificialmente suas reais vocações esportivas, terá suas consequências para os esportes que não encontrarem patrocinadores e grande público.
10) A tendência tem sido o gigantismo olímpico. Mais países e delegações cada vez maiores.
Um dos riscos é o da introdução crescente de modalidades que respondem mais aos interesses de patrocinadores e de organizadores do que às necessidades do esporte.
11) O casuísmo do pódio de bronze para os jogadores de futebol do Brasil é uma das maiores quebras do espírito olímpico jamais vista.
Os jogadores argentinos, prata, foram cobrados porque não aplaudiram os nigerianos, ouro. Que dizer então do Brasil que fugiu covardemente da cerimônia mais importante de uma Olimpíada?
Só por este show de desonra esportiva o Brasil já não seria digno da medalha de ouro no futebol.
Uma vergonha.

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