São Paulo, terça-feira, 13 de agosto de 1996
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Ainda não

ANDRÉ LARA RESENDE

O México até hoje não se recuperou da grave crise que enfrentou depois de desvalorizar a sua moeda em dezembro de 1994. Seria o Brasil o próximo México? A pergunta foi feita a vários especialistas por uma conceituada revista de política econômica americana. Não pude atender ao convite, mas estou curioso.
Robert Barro, um renomado macroeconomista, professor da Universidade de Harvard, disse na semana passada no Rio que o programa de estabilização brasileiro não lhe parecia sério o suficiente. Mera provocação? Talvez, mas um pouco de serenidade na análise das críticas, mesmo aquelas que nos parecem provocação, não faz mal a ninguém. Afinal, o número de críticos com credenciais respeitáveis tem aumentado.
É fácil demonstrar que o quadro atual é diferente da situação mexicana às vésperas da crise. Lá o déficit em conta corrente no balanço de pagamentos atingira 8% do PIB. A dívida externa de curto prazo era muito superior às reservas internacionais, reduzidas a menos de três meses de importações. A poupança interna caíra a menos de 14% do PIB e a taxa de crescimento da economia, apesar do abundante influxo de capitais externos, não chegara a 2,5% ao ano nos cinco anos que antecederam a crise.
Aqui, o déficit em conta corrente, inexistente até 1993, não chega a 3% do PIB. A dívida externa, estável e com um perfil favorável, é inferior a 12% do PIB. As reservas internacionais, acima de US$ 60 bilhões, são equivalentes a mais de 15 meses de importações. Tanto a poupança interna, 19% do PIB, quanto o crescimento, 4,7% nos últimos três anos, estão abaixo das taxas da década de 70, mas são muito superiores aos números mexicanos.
Diferente, não há dúvida. Mas algum provocador poderia observar que, de fato, o Brasil não é o México, ainda. Que argumentos teríamos para contestá-lo?
Temos consciência dos problemas e do que deve ser feito, fez questão de dizer o ministro da Fazenda. O déficit em conta corrente deve ser mantido sob controle para não nos tornarmos excessivamente dependentes de capitais externos. Para isso é necessário aumentar a poupança interna pública e privada. É preciso reduzir o déficit público a valores financiáveis internamente.
Infelizmente, não basta ter consciência. Temos tido mais dificuldade do que seria desejável nas reformas de fundo. Houve uma significativa e surpreendente deterioração das contas públicas no ano passado e a melhora esperada para este ano, a julgar pelos números do primeiro semestre, não deverá se confirmar. Essa é sem sombra de dúvida a razão pela qual analistas isentos questionam nossa capacidade de consolidar a estabilização e retomar o crescimento.
A combinação de regimes democráticos com carências sociais dramáticas, como observou Robert Barro, não facilita a tarefa de reorganização das contas públicas. O percurso parece bem menos nítido e os ziguezagues, inevitáveis. Mas há menos de três anos, com a inflação de 50% ao mês, quem teria apostado nos extraordinários progressos que fizemos? Eu não apostaria contra o Brasil, ainda.

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