São Paulo, quinta-feira, 15 de agosto de 1996
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Vanguarda italiana se encontra em São Paulo

NELSON ASCHER
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

Os poetas italianos Edoardo Sanguineti (1930) e Lello Voce (1957) estão em São Paulo a convite do Instituto Italiano di Cultura para participar de eventos ligados à Bienal do Livro e de um curso na USP.
Eles participarão de um debate na Folha hoje, junto com a professora Aurora Bernardini, da USP. Sanguineti, além de professor, crítico literário e romancista, é atualmente o poeta mais importante de seu país e foi um dos fundadores do movimento de vanguarda conhecido como Grupo 63.
Lello Voce pertence à novíssima geração, autodenominada Grupo 93, que, depois de duas décadas de refluxo e acomodação na arte italiana, retoma o trabalho da vanguarda anterior, menos por meio de publicações que de performances públicas. A seguir, trechos da entrevista de ambos à Folha.
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Folha - Qual a situação hoje da poesia na Itália?
Edoardo Sanguineti - Eu diria que, depois do movimento do qual participei, o Grupo 63, o único grupo significativo que se constituiu é o Grupo 93, que na realidade foi fundado alguns anos antes.
Esses foram movimentos poéticos de vanguarda mais significativos da Itália e o grupo mais recente, se bem que tendo grande diversidade interna, é o fenômeno mais interessante dos últimos anos.
Trata-se de uma situação ainda em desenvolvimento, pois são poetas ainda jovens -de 25 a 40 anos- e ainda se espera necessariamente sua maturação.
Folha - Que é ser de vanguarda atualmente.
Sanguinetti - Hoje parece-me bastante difícil definir as coisas. Minha impressão é que nos anos 50/60 havia um movimento muito forte não só na Itália, mas na Europa e no mundo, e não somente na poesia, como também nas artes plásticas, na música, no cinema.
Foram dois decênios muito inovadores, que marcaram a segunda metade deste século. A situação agora é muito mais complicada, porque a pesquisa tende a cristalizar-se mais facilmente.
Os anos 70/80 foram de refluxo, de retorno à ordem. Agora há jovens que querem retomar o discurso de maneira inovativa.
Folha - E ser de vanguarda nos anos 50/60?
Sanguinetti - Significava coisas diversas. Uma era de natureza opositiva, ou seja, refutar uma tradição "novecentesca" cristalizada sobretudo depois do fenômeno daquela restauração que se deu em grande parte nos anos 30 sob a forma de um certo neoclassicismo.
Por outro lado havia a necessidade de retomar a vertente crítica, eu diria anárquica, da grande tradição do moderno, ou seja, tudo o que veio do expressionismo, do dadaísmo, do surrealismo.
Finalmente, havia, pelo menos para mim, uma exigência de realismo, ou seja, de achar modos de expressão adequados ao que era o mundo depois das transformações ocorridas com a Segunda Guerra.
Folha - Como você definiria a poesia de sua geração?
Lello Voce - A minha é uma geração surgida depois de um período de grande refluxo, não só poético, mas filosófico e epistemológico em geral, nas artes em relação à geração de Sanguinetti.
Esse refluxo produziu uma mudança de gosto -e não só na Itália- não tanto do público, mas principalmente da crítica e das editoras, e se gerou poetas -os da antologia da "Palavra Apaixonada"- que propunham substancialmente uma escrita muito simples, que ia do neointimismo ao minimalismo, uma vertente meio místico-órfica na sua última fase.
Nós reintroduzimos um debate que faltava, retomando as duas vanguardas anteriores, a do começo do século e a do Grupo 63.
Como nesta última, buscamos uma poesia que tivesse uma relação crítica com o real e trabalhasse com a linguagem não para torná-la mais agradável ou melódica, mas para fazê-la mais dura, cheia de atrito, de modo que pudesse em alguma medida transformar-se no espelho das contradições do mundo em que vivemos.
Por outro lado, sentíamos, mais do que no caso da vanguarda anterior, uma necessidade de torná-la comunicativa.

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