São Paulo, domingo, 18 de agosto de 1996
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Chaves para entrar na caverna de Platão

WILLIAM LI
ESPECIAL PARA A FOLHA

Acaba de ser lançado pela Editora Moderna o volume "Platão Por Mitos e Hipóteses", da professora Lygia Araujo Watanabe, do departamento de filosofia da USP.
Existem quase 2500 anos de erudição a respeito de Platão. Pode-se dizer que ele foi o filósofo mais lido em toda a história da filosofia. Existem milhares de comentários, desde antigos e medievais até contemporâneos sobre seus famosos "Diálogos". Para que então mais um livro sobre Platão ?
O livro de Lygia Watanabe tem o grande mérito de servir como uma porta de entrada lúcida e clara aos estudantes brasileiros, calouros ou de segundo grau, que queiram se iniciar na obra daquele que foi considerado o "filósofo" por excelência.
Livros eruditos sobre temas específicos, teses universitárias e artigos especializados não faltam nem na bibliografia nacional. Faltou a chave que abrisse a porta a esse mundo tantas vezes revisitado, e que não podemos presumir que um estudante secundarista ou um calouro de universidade deva necessariamente possuir. Pois é justamente essa chave que Lygia Watanabe oferece ao neófito, sem medo de repetir mais uma vez o que pode parecer o óbvio mesmo para um estudante mais avançado.
Lygia Watanabe apresentará o seu Platão básico a partir de três questões essenciais de sua filosofia e que foram até incorporados pelo senso comum. Afinal, não falamos em "amor platônico", "mundo das idéias" ou "sociedade ideal"? Esses três grandes temas -moral, teoria do conhecimento e política- são abordados pela autora da mesma forma como o foram por Platão: por hipóteses e mitos. Ao investigar um tema qualquer, os diálogos platônicos, em geral, propõem uma série de hipóteses, muitas vezes sem chegar a lugar algum.
Mas isso já pode ser considerado um progresso, pois o terreno foi revolvido e sabemos quais as trilhas que não devem mais ser seguidas. Com sua noção de "idéia", Platão antecipa já a "forma" ou "essência" aristotélica -que dominará toda a metafísica ocidental até Kant. E quando não consegue compreender plenamente a realidade de certas questões fundamentais -o que somos? para onde vamos? por que a injustiça é recompensada?- Platão recorre ao mito como o escritor a uma metáfora. Se não consegue explicar, pelo menos nos fornece um retrato fiel dessas questões fundamentais.
Em linguagem simples e clara, com tabelas e uma retrospectiva histórica do platonismo, a autora nos oferece uma primeira visão panorâmica que pode ser a chave para a iniciação da leitura dos "Diálogos" de Platão.
O livro traz ainda uma antologia de textos e sugestões de trabalhos. Não é um livro ambicioso nem traz nenhuma novidade sobre a filosofia platônica, constituindo-se, como já dissemos, numa chave para a porta de entrada do universo platônico. E é precisamente deste tipo de livro que o Brasil precisa.

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