São Paulo, domingo, 18 de agosto de 1996
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'São Paulo, Brasil' desperdiça temas e convidado

FERNANDO DE BARROS E SILVA
ESPECIAL PARA A FOLHA

Estreou no último domingo o programa "São Paulo, Brasil" (TV Cultura, 20h), uma versão abrasileirada do "Manhattan Connection", que o GNT põe no ar também aos domingos com os jornalistas Lucas Mendes, Paulo Francis, Caio Blinder e Nélson Motta.
Para não deixar dúvida quanto à paternidade do "São Paulo, Brasil", seu âncora, o ex-presidente da Fundação Padre Anchieta e empresário de comunicações Roberto Muylaert explicou logo no início aos telespectadores as razões da presença de Lucas Mendes, o âncora do "Manhattan", como convidado do primeiro programa.
Além deles, estavam o jornalista Bob Fernandes, editor da revista "Carta Capital", e a colunista da Folha Barbara Gancia, que completam a equipe fixa do programa.
Num dia em que a TV está particularmente coalhada de boçalidades, como o domingo, um programa que pretende debater ao mesmo tempo os temas da semana, fatos diversos e polêmicas na ordem do dia é, de saída, algo que chama a atenção e merece registro.
Em que pese o aspecto positivo da iniciativa, o fato é que "São Paulo, Brasil" acabou frustrando na estréia.
O lado mais visível dessa frustração era a expressão meio atônita do próprio Lucas Mendes, que entrou mudo e saiu calado, atropelado pela ansiedade dos demais debatedores, em particular Barbara Gancia, ávida por fazer gracinhas, muitas delas interrompendo o raciocínio alheio. Muylaert chegou a pedir licença à debatedora para fazer uma pergunta ao convidado.
Não foram poucas as vezes em que predominou o zunido das vozes entrecruzadas, criando o mesmo efeito entrópico da "Mesa Redonda" do Roberto Avallone.
Mas não foi só Lucas Mendes que "São Paulo, Brasil" desperdiçou. Alguns assuntos acabaram rendendo muito menos do que deveriam. O primeiro deles foi a censura ao compositor Tiririca, ótima ocasião para discutir liberdade de expressão e racismo. Quando parecia que o tema ia esquentar, pulava-se logo para outro, abortando o debate precipitadamente.
O mesmo aconteceu com o fechamento do "Pravda", jornal oficial da ex-URSS. Da mesma forma que foi levantado, o tema evaporou, num passe de mágica.
Um terceiro desperdício se deu quando a performance da delegação feminina do Brasil na Olimpíada serviu de gancho para debater a condição da mulher e o que Muylaert chamou de "novo feminismo", cujo pressuposto seria a defesa da diferença entre os sexos e não mais a palavra de ordem pela igualdade, como nos anos 60.
O que aconteceu? Quase nada. Barbara Gancia disse que muitas atletas eram "invertidas". Muylaert contestou e encerrou a discussão mostrando às câmeras o livro "Elogio da Diferença - o Feminino Emergente", da feminista Rosiska Darcy de Oliveira, segundo ele, uma obra que ilumina de forma nova o assunto. Tudo bem. Acontece que o livro de Rosiska é de 1991. No programa, parecia um lançamento desta Bienal.
Feito o balanço, sobraram alguns comentários inteligentes de Bob Fernandes sobre política e economia, áreas em que ele opina com conhecimento de causa, embora ainda pouco desenvolto diante do formato ingrato da TV.

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