São Paulo, segunda-feira, 19 de agosto de 1996
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Homens práticos

JOÃO SAYAD

Por que às vezes procuramos os óculos em cima da mesa, em toda a casa e eles estão dependurados no nosso nariz? Por que muitas vezes o óbvio e o evidente se escondem atrás de muros inconscientes e proibições que não existem?
Só homens práticos são realmente livres. Resolvem problemas sem qualquer constrangimento de princípios, não inventam obstáculos imaginários, não se prendem a teorias ou formas dadas de pensar. Cada problema é um novo problema para ser pensado e resolvido ali e àquela hora.
Colombo é homem livre para colocar o ovo em pé. Ultrapassou limite sutil, oculto, e por isso mesmo, quase intransponível para o homem comum.
Pode ter se frustrado ao descobrir a América. Queria a Índia. Não usufruiu da felicidade de ter chegado ao Novo Mundo. Liberdade e felicidade foram perturbadas por anseios exagerados, teorias não verificadas. O Colombo do ovo é quem fez a navegação e comandou os três navios do Colombo da América.
É difícil entender porque os autores do Plano Real colocam como condição de sucesso a aprovação do Fundo Social de Emergência.
Um homem prático colocaria como condição um fundo de apoio às exportações.
Mais difícil ainda, entender por que o governo argentino e o FMI se preocupam com o preço dos combustíveis e não com a balança comercial. E hoje somos mais do que nunca irmãos dos argentinos na felicidade e na adversidade.
Por isso, há muitos meses que os torcedores do Plano Real estão esperando pela isenção de impostos das exportações. A proposta tramita no Congresso como lei complementar ou emenda constitucional.
Os governadores não querem perder nenhum tostão de receita. O Tesouro Nacional, por outro lado, não quer compensar os Estados com nenhum tostão a mais que o devido. E assim o tempo passa, apertado na barganha pão-dura entre cofres da União e dos Estados.
Por que o Banco do Brasil não pode anunciar nos jornais que, a partir de hoje, dará um financiamento com prazo de dez anos, sem correção monetária e sem juros para financiar todos os impostos que os exportadores pagam? Seria fácil, rápido e imediato.
Por que não pode? Na guerra fiscal entre os Estados, muitos usam esse expediente.
Será porque o Banco do Brasil está se reestruturando e não pode emprestar com prejuízos? O Tesouro Nacional pagaria a diferença entre o custo desses empréstimos e a receita do banco. Talvez o Tesouro Nacional não tenha mais crédito aprovado com o Banco do Brasil, o que é compreensível.
Aumentaria o déficit público? O déficit público vai aumentar de qualquer jeito se as exportações deixarem de pagar impostos. E aumentar as despesas do Tesouro com isenção de impostos de exportação é muito melhor do que aumentar as despesas com juros.
Será porque reabriria a conta movimento entre Tesouro Nacional e Banco do Brasil?
Qual o problema de reabrir essa famigerada conta? É medo do retorno do orçamento monetário?
Afinal de contas o Banco Central tem conta movimento com o Tesouro. Quando compra reservas e aumenta a dívida, paga juros e debita direta ou indiretamente e sem autorização o Tesouro Nacional.
Será que essas limitações e dúvidas são maiores ou mais concretas que as dificuldades em aprovar a isenção das exportações no Congresso Nacional, cheio de deputados representando Estados apertados por juros altos e dívidas elevadas?
Quais são os limites reais, quais os imaginários? Onde estão os meus óculos?

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