São Paulo, quinta-feira, 22 de agosto de 1996
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Pádua diz que não viu Paula matar atriz

SERGIO TORRES
DA SUCURSAL DO RIO

Guilherme de Pádua, 26, afirmou em entrevista à Folha que não viu o momento em que sua ex-mulher, Paula Thomaz, 22, teria matado a golpes de tesoura a atriz Daniella Perez.
Daniella foi morta na zona sul do Rio, em 28 de de dezembro de 1992. Tinha 22 anos. Pádua confessou o crime no dia seguinte. Paula jamais confessou. Os dois serão julgados na quarta-feira que vem, no 1º Tribunal do Júri do Rio.
Pádua diz agora que Paula matou Daniella. A entrevista foi dada no presídio Ary Franco (zona norte), onde o ator está preso.

Folha - Por que razão, no começo, você assumiu o crime sozinho?
Pádua - Não foi um crime planejado. Se fosse, não teria sido tão burro. Era o suspeito principal, porque tinha saído junto com a Daniella. Todo mundo viu. Quando ocorreu, decidi que não podia estragar minha vida, tinha de salvar meu filho, minha mulher. Ninguém quer enfrentar cadeia, você imagina que vai ser estuprado, morto. Tinha esperança de me safar. Fiquei horas na delegacia tentando convencer os policiais de que não tinha feito nada. Não consegui. Em determinado momento alguém falou: "E sua mulher? Também não estava lá?". Decidi confessar antes que pegassem a Paula. Telefonei para ela. Disse para ficar quieta que ia assumir sozinho. Não fui lá confessar. Queria escapar da cadeia.
Folha - O que fez você mudar a história?
Pádua - Entrevistas em que a Paula dizia coisas contra mim, instruída por advogados. Fiquei muito decepcionado. Meu mundo desabou. Aí o Paulo Ramalho (advogado) me disse: "Ou você fala ou estou fora da causa. Quero que conte a verdade". Resolvi falar.
Folha - Você acha verossímil essa segunda versão?
Pádua - É a mais detalhada, a única que combina com as provas do processo. Só mudei de história uma única vez. A primeira, inventei na delegacia. Mudei porque a Paula não merecia mais minha proteção. Não acho que vai mudar muita coisa defendê-la ou não. Acho que a gente vai pegar cadeia do mesmo jeito.
Folha - Você teve um caso com Daniella?
Pádua - Tive. Era mulherengo demais. O caso foi se tornando muito envolvente, mas, ao mesmo tempo, tinha um lado meu que queria trabalhar a família, construir uma casa. Era louco para ter um filho, e minha mulher ficou grávida. Isso tornou mais difícil o relacionamento com a Daniella. A Paula ficou muita nervosa e desconfiada. Decidi não ficar mais com a Daniella. Um dia ela me ligou, Paula soube e saiu batendo porta, xingando. A relação deve ter durado três, quatro meses. A coisa estava crescendo quando a Paula engravidou.
Folha - O que ocorreu no dia?
Pádua - Paula pediu para sair comigo. Fomos passear no shopping. Na hora da gravação, ela falou que ia ficar no carro descansando. Na Tycoon (estúdio), a Dani falou: "Vamos conversar hoje?". O que vou falar? Precisava da amizade dela. Ao mesmo tempo minha mulher esperava no carro. No intervalo fui no carro tentar dispensá-la, mas ela não quis ir embora. Disse a Paula que tinha de ser amigo da Daniella. Paula começou a me xingar. Reclamei e ela disse que eu podia conversar com Daniella, mas pediu que a levasse para ouvir a conversa. Ela jurou que ficava escondida no carro.
Quando voltei, falei para a Dani que a gente podia conversar. Acabei a gravação às 21h15. Dani tinha uma ou duas cenas a mais. Saímos 21h30, 21h45. Saí primeiro. Mais à frente, ela parou do meu lado: "Gui, onde a gente vai?". "Não sei, Dani". Ela falou para segui-la até "um lugar aqui perto que conheço". Não conhecia o local.
Daniella parou o carro, parei atrás, desci. Ela saiu e ficou na minha frente. Estava tranquilo porque a Daniella se dava valor, não ia tentar nada sem eu dar espaço. Ela não mendigava carinho. Conversamos, aquele papo de quem não tem o que dizer. Aí falei para ir embora. Em voz alta, para a Paula ouvir. Daniella falou para ficar mais um pouquinho. Aí ouvimos um barulho no carro. Paula gritou: "Vamos embora Guilherme!".
Daniella não falou nada. Olhou para a Paula, que gritou: "Você não tem vergonha, dando em cima do marido dos outros". Dani respondeu: "Se enxerga, menina!".
Paula partiu para cima da Daniella dando porrada. A primeira coisa que me veio foi que a Paula não podia fazer esforço. Segurei a Daniella com o braço direito em torno do pescoço e empurrei a Paula pelo corpo, pela cara, pelos braços. Eram empurrões certeiros. Não podia acertar a barriga. Eu dava um arranco e provavelmente a Daniella não devia estar conseguindo respirar. Quando ela foi ao chão, caí junto. Fiquei por cima dela, a Paula por cima xingando.
Fui levantando, com a Paula atracada nas minhas costas. Dava tapinhas no rosto da Dani, que estava mole. Achei que tinha quebrado o pescoço. Tentei escutar o coração, nada. Mão no pulso, nada.
Falei que Daniella estava morta. Paula me abraçou chorando, pedindo calma. E se alguém anotasse a placa? Lembrei que no carro havia uma fita isolante. Comecei a mexer na placa. Quando acabei, cadê a Paula? Estava perto da Daniella. Vi a Paula agachada, com a tesoura na mão. Ela tinha acabado de fazer as perfurações.
No carro, perguntei por que ela tinha feito aquilo. "Amor, você é o principal suspeito, todo mundo sabia que ela saiu com você. Fãs malucos fazem isso." Na hora me pareceu razoável. Parei na praia da Barra, joguei a tesoura longe.
Folha - Você crê na absolvição?
Pádua - Me sinto muito culpado. Não consigo dormir tranquilo. É uma culpa que me acompanhará o resto da vida. Queria pagar de alguma forma. Penso nela todo dia. Semana passada sonhei com ela.

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