São Paulo, sexta-feira, 23 de agosto de 1996
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É preciso mais do que paixão pelo Corinthians

ABRAM SZAJMAN
ESPECIAL PARA A FOLHA

Confesso que tenho essa velha paixão, que é o futebol. E, dentro do futebol, a maior de todas é a paixão pelo Corinthians. Quando vejo o "meu" Corinthians atravessando má fase, sinto vontade de calçar chuteiras e entrar em campo. Mas, nesta altura da vida, que triste figura faria no contato direto com a bola.
Resta-me, entretanto, uma proposta: quem sabe, se a imensa nação corintiana assim o desejasse, um menino pobre, do Bom Retiro, hoje veterano entusiasta da camisa preto e branca, não poderia ser útil para o time nesta difícil quadra de sua existência?
Com certeza é um grande desafio. Mas gosto de desafios. Sinto terríveis frustrações ao ver a gloriosa camisa passar por momentos inglórios.
Se não sirvo como jogador, teria o maior orgulho em dar uma "mãozinha", caso a maior torcida do Brasil, da qual faço parte, me aceitasse.
Reunir velhos amigos corintianos, listar os problemas do clube e resolvê-los um a um, como se faz numa empresa. Enfim, estou pronto para adentrar o gramado.
Sei o que acontece quando as coisas não andam bem. Todos esperam alguma coisa acontecer -e rápido. É problema do técnico, do preparador físico; faltam nomes consagrados?
Na derrota, os recursos somem; nas vitórias, brotam de todos os lados. Mas tudo se resume num único problema: o Corinthians precisa de um time à altura de sua tradição.
O clube tem de ingressar rapidamente no futebol moderno, tratado hoje como empreendimento econômico-financeiro. Falta-lhe produção. Time que não produz só irrita o torcedor, esvazia os estádios, baixa sua cotação no mercado internacional, desvaloriza os jogadores em formação. Time perdedor é mau negócio.
Nosso Corinthians não pode ser humilhado, só porque mudaram os tempos, e o futebol boêmio não existe mais.
Se o problema é profissionalizar, por que não fazer o serviço completo e profissionalizar a direção do clube? Futebol é paixão muito séria para depender de improvisações.
Como se diz na Fiel, futebol é jogo para homem, e dirigir time é coisa para quem gosta de enfrentar bolas divididas no peito e na raça.
Preciso cuidar de um coração que pulsa corintiano desde criança. Por isso, convoco os companheiros corintianos para uma reflexão. Tenho a certeza de que não existe nenhum problema no Parque São Jorge que uma seleção de mosqueteiros, bem treinada nas artes do comércio e das finanças, não possa resolver.
O Coringão existe para jogar um grande futebol, para satisfazer sua imensa torcida, presenteando-lhe com grandes equipes e grandes exibições. Uma empresa com esse cabedal e com essa tradição tem de gerar recursos para o financiamento de suas atividades e não deixar que elas feneçam.
Alguns times de futebol correm o risco de serem relegados à condição de coadjuvantes do grande espetáculo futebolístico, por falta de estrutura adequada, por não atingirem a economia de escala que possa sustentar o empreendimento.
Somos todos corintianos. Mas é preciso mais do que paixão para fazer com que uma instituição sobreviva.

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