São Paulo, domingo, 25 de agosto de 1996
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Crescimento pode coincidir com reeleição

GILSON SCHWARTZ
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

O momento é de baixa. Mas o economista, especialmente o economista no poder, é antes de tudo um enxadrista. Tenta enxergar vários lances à frente. A economia é feita de ciclos, coisa que José no Egito já sabia. Se depois das vacas magras virão as vacas gordas, por que desesperar?
O problema na política é sempre de tempo, e a política econômica não é exceção. José no Egito cravou sua aposta em ciclos de sete anos. Os tucanos podem fazer uma aposta com horizonte temporal mais curto, jogando tudo numa retomada do crescimento com inflação baixa bem no momento em que a sociedade estiver discutindo e o Congresso votando a proposta da reeleição.
Algumas armas estão disponíveis. O BNDES anuncia um orçamento para 1997 que vai encostar nos R$ 17 bilhões. Nem o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) tem tanto dinheiro para gastar em toda a América Latina.
A economia está atolada numa crise de crédito. A classe média abusou do crediário. Os bancos, públicos e privados, carregam micos bilhonários. Mas as operações batizadas de "tirar esqueleto do armário" estão a todo vapor, do Proer às injeções de recursos no Banco do Brasil. Agora, dói. Daqui a seis ou nove meses, se outros bancos oficiais e alguns privados reenergizados voltarem a emprestar, o ambiente pode mudar.
As grandes privatizações, como a da Vale do Rio Doce, também estão previstas para o início de 1997. O ministro Kandir, do Planejamento, fala em pelo menos R$ 10 bilhões entrando no caixa oficial. Financiando-se com a venda de ativos, o governo poderia recorrer menos ao endividamento e, portanto, reduzir mais rapidamente as taxas de juros.
Hoje o que se vê é uma inflação baixa, que só não é menor porque as estatais têm obtido lautas correções tarifárias. Agora, dói. Mas estão aumentando os lucros dessas empresas. Lucros podem ser reinvestidos. No ano que vem, as estatais poderiam ser usadas para aumentar o nível de gastos na economia e, sem correções reais de tarifas, contribuiram para manter a inflação baixa.
Outra grande arma são as reservas internacionais. Muita gente andou perguntando nos últimos dois anos o porquê de acumular tanta reserva. A resposta poderá vir nos próximos dois anos.
Como dizia Garrincha, só falta combinar com os "adversários". Ou adversidades, sobretudo políticas aqui dentro, econômicas nos mercados financeiros internacionais.
Reservas declinantes assustam. Déficit público (alguém precisa pagar a conta) também. O ambiente externo está relativamente calmo, mas os juros podem voltar a subir nos EUA nos próximos meses (especialmente depois que estiver assegurada outra reeleição, de Clinton).
O investimento estrangeiro está subindo, mas ao mesmo tempo ocorre um "desinvestimento" entre os capitalistas locais. E o desemprego, que disparou com a freada na economia, provavelmente não vai ser totalmente superado mesmo se a economia crescer mais.
Gastar mais, privatizar mais, receber mais investimentos externos e ao mesmo tempo segurar o câmbio e até, se necessário, perder reservas para acomodar um crescimento maior, tudo isso é possível. os riscos é que não são nada desprezíveis. Mas desde os faraós sabe-se que o traço mais marcante do monarca é sonhar.

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