São Paulo, terça-feira, 27 de agosto de 1996
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Das malas e dos malas

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - Mês que vem, as eleições municipais entram naquilo que os entendidos chamam de "reta final". Fiz algum esforço para me emocionar com o cívico e doméstico evento, mas não deu. Mesmo assim, li interessante reportagem sobre os gastos com as campanhas e fiquei pasmo -quando deveria ficar entediado. Nenhuma novidade.
Razão de sobra tinha PC Farias quando declarou a Cosette Alves que, sem mudança na legislação eleitoral, a corrupção seria obrigatória em todos os níveis da representação popular. De presidente da República a vereador de Pirapora, o dono da mala preta daria as cartas antes, durante e depois dos mandatos obtidos pelo voto popular.
Mala preta é metáfora antiga. Na era dos impulsos eletrônicos e dos códigos bancários, ela se tornou descartável.
Mas o seu portador, o inescrutável "homem da mala preta", está cada vez mais presente na vida administrativa e política do país. Dois deles merecem destaque.
O primeiro, e ainda o mais notório, foi o citado PC Farias. Acabou mal, num quarto vulgar de sua casa praiana, ao lado do cadáver arreganhado de sua amante e assassina. Mas durante algum tempo deu a régua e o compasso no governo que elegeu. Nos tempos de poder, a única reclamação que dele se conhece foi a queixa de que "madame está gastando demais".
O segundo é o atual ministro Sérgio Motta. Sua desenvoltura nos altos escalões emerge e se irradia da mala preta que carregou e carregará num futuro próximo. Ignora-se a razão pela qual os malas-pretas não gostam das madames. Sérgio Motta não admira a solidariedade de dona Ruth, "masturbação sociológica" em sua definição.
Guardadas as circunstâncias, mudando o que pode ser mudado, o desabafo dos dois malas-pretas podem não ser idênticos, mas são análogos. E revelam o tipo de poder que eles exercem nas entranhas de governos financiados por fantasmas.

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