São Paulo, quarta-feira, 28 de agosto de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

A prioridade nacional

LUÍS NASSIF
SUPONHA-SE A SEGUINTE CENA CORRENTE.

1) O jovem A, de boa formação técnica, desenvolve idéia criativa.
2) Ele se une ao jovem B -de boa formação gerencial- e ao jovem C -um craque em marketing- e todos resolvem montar uma empresa.
3) Vendem bens pessoais, tentam convencer um vizinho rico a entrar de sócio e buscam financiamento bancário.
Como não têm bens para dar em garantia, o pedido é recusado. Os jovens voltam para seus trabalhos de origem e a idéia -que poderia ajudar o país a gerar empregos, inovações e investimentos- é arquivada.
Agora, a partir do passo três, incluam-se as seguintes novidades:
3) Os jovens buscam um banco de investimentos, ou um escritório especializado, e montam um plano de negócios.
Nesse plano estão definidos o produto, a destinação dos investimentos, compromissos de profissionalização de gestão e de abertura de capital -assim que a empresa tiver dimensão para tal.
4) De posse do plano, tem início um "road show", uma rodada de visitas a fundos de investimento, tanto convencionais como especializados em empresas emergentes.
5) Alguns fundos se interessam, analisam o projeto, investem o dinheiro. Dali a um tempo, com a empresa vitoriosa, abre-se o capital e os fundos vendem as ações em bolsas, embolsando lucros expressivos.
Milagre americano
A primeira cena é tipicamente brasileira. A segunda, é americana. Ambas partem da mesma base -uma boa idéia. A primeira gora, por falta de condições; a segunda prospera.
A diferença entre os destinos de ambas as idéias é a mesma que separa a estagnação secular da economia brasileira do dinamismo da economia americana: a capacidade de reorganizar a poupança e encaminhá-la para a atividade produtiva.
Tome-se o caso americano. Nas últimas décadas, as empresas japonesas ganharam níveis de eficiência bastante superiores às suas rivais americanas.
No entanto, é a economia americana que está explodindo, desmentindo todas as avaliações recentes sobre sua decadência.
Na raiz desse fenômeno está justamente a forma como está se reorganizando a poupança americana.
Ao abrir espaço para o surgimento e crescimento de novos empreendedores -por meio do mercado de capitais-, criou-se um movimento dinâmico, extraordinário, uma gigantesca renovação de idéias e de empresários, que liquidaram com velhos cartéis e voltaram a impulsionar a economia americana.
Plano Brasil
O Brasil precisa desse modelo para ontem. A economia está madura para ingressar nessa nova fase.
1) A abertura e desregulamentação da economia, ao mesmo tempo em que fragilizaram muitos setores da vida nacional, abriram excelentes perspectivas de negócios em outras áreas. Sem capital, as empresas brasileiras promissoras estão sendo vendidas na bacia das almas.
2) Já existe tradição de análise técnica setorial, tanto nos novos bancos de negócios quanto no sistema de bancos de desenvolvimento.
3) Já existe a cultura de fundos de investimentos e fundos de pensão, inclusive para permitir ao governo a transformação do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) em fundo de investimento, com vistas à privatização.
4) Já está maduro o conjunto de leis de modernização do mercado de capital.
O que falta? Unicamente um empurrão, um mero empurrão, como a aprovação da Lei das S/As, a nova regulamentação dos fundos de pensão e a transformação dessa bandeira em prioridade.
Assim a economia brasileira poderá libertar-se definitivamente do jugo do patrimônio, que permite apenas aos detentores de patrimônio acesso a financiamento e investimento.

Texto Anterior: Fed vê desaceleração do PIB dos EUA
Próximo Texto: Aluguel de casas baixam em SP em julho, diz Creci
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.