São Paulo, sexta-feira, 30 de agosto de 1996
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Estado economiza ao pagar 'coquetel'

AURELIANO BIANCARELLI
ENVIADO ESPECIAL A RECIFE

O médico canadense Mark Wainberg, convidado do 9º Congresso Brasileiro de Infectologia que terminou ontem em Recife, defende uma campanha internacional para convencer os governos a comprar todos os medicamentos para o tratamento da Aids.
A idéia é também uma das principais reivindicações de ONGs ligadas à Aids em todo o mundo.
"Os governos só teriam a ganhar", afirma Wainberg, que dirige o centro de Aids do Jewish General Hospital, de Montreal, no Canadá.
Wainberg afirma que a maior força desses argumentos é a relação custo-benefício: um doente tratado terá menor carga viral, o que significa diminuir o risco de contaminação.
Também não deixará de trabalhar, continuará pagando impostos e não gastará dinheiro público com internações e aposentadorias. "É só fazer as contas", sugere Wainberg.
Sem a participação dos governos, o "mercado da Aids" ficará reduzido a menos de 2 milhões de portadores e doentes de Aids. No mundo todo, estima-se que o número de pessoas infectadas pela Aids no ano 2000 será de 45 milhões.
O custo de um tratamento com o "coquetel" de remédios disponíveis chega a R$ 1.200 por mês. Especialistas e diretores de grandes laboratórios avaliam que o mercado ficará restrito à Europa, EUA e às classes mais ricas da Ásia. Nos outros países, como o Brasil, os doentes só receberão os remédios se os governos comprarem.
"O grande desafio atual é fazer cair os custos dessas drogas", diz John Martin Leonard, vice-presidente de desenvolvimento de medicamentos antivirais da Abbott.
No Brasil, o governo já assumiu publicamente o compromisso de oferecer o "coquetel" de remédios disponíveis para cerca de 10 mil pacientes em pior estado.
O custo estimado é de R$ 144 milhões por um ano, aqui incluídos todos os antivirais consumidos pelo conjunto dos doentes. Estados e municípios devem arcar com 30% dos gastos.
Se o Ministério da Saúde optasse por bancar o "coquetel" para os cerca de 44,5 mil doentes vivos notificados, teria de gastar pelo menos dez vezes mais.
"Matar" no começo
Se os governos seguissem a orientação de alguns especialistas presentes em Recife, os custos com a Aids seriam insuportáveis.
Eles defendem o uso do "coquetel" já no início da infecção como forma de interromper o avanço do vírus.
"A terapia combinada deve ser aplicada em todos os portadores e doentes o mais cedo possível", afirma Mark Wainberg. Segundo ele, as chances de controlar o HIV logo no início são muito maiores.
Essa mesma tese foi defendida por Jeffrey Nadler, da Universidade da Flórida do Sul, em Tampa.
Se essa regra fosse seguida à risca, o Brasil teria que tratar os cerca de 500 mil portadores estimados. Seriam mais de R$ 600 milhões por mês.

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