São Paulo, sábado, 31 de agosto de 1996
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Pacote traz gigantes e revelações do jazz

CARLOS CALADO
ESPECIAL PARA A FOLHA

Um ritual do mercado fonográfico brasileiro está sendo alterado. Até o ano passado, as gravadoras aguardavam o Free Jazz Festival para desovar seus lançamentos de jazz. Em 96, isso mudou.
Não bastassem as dezenas de discos do gênero lançados nos últimos meses, a 40 dias do festival as lojas estão recebendo mais um suplemento bem atraente: os novos trabalhos de quatro pesos-pesados e três revelações do jazz atual.
O saxofonista norte-americano Sonny Rollins, 65, já não grava mais todos os anos. Por isso, seu novo CD "Sonny Rollins' 3" tem um sabor especial.
Com um repertório recheado de "standards" e baladas, seja a cafona "Monalisa" ou a clássica "They Say It's Wonderful" (de Berlin), Rollins mostra que seu sax tenor áspero e bem-humorado continua afiadíssimo.
Mas é em duas composições próprias e inéditas que ele se supera, parecendo decidido a romper com a apatia de seus últimos discos. Em "H.S", revive o vigor dos tempos do "hard bop". "Biji" é uma aula de swing e arquitetura melódica.
"Descoberto" apenas nesta década, o também tenorista Joe Lovano, 44, está vivendo seu pico de popularidade. Acaba de ser eleito "músico de jazz do ano" pela influente revista "Down Beat".
O CD duplo "Quartets" registra duas temporadas de Lovano no templo nova-iorquino do jazz: o mitológico Village Vanguard.
Lovano não fugiu à regra. Liderando dois quartetos diferentes, em 14 faixas longas, ele esbanja imaginação e vigor, ao lado de feras como Mulgrew Miller (piano) e Tom Harrell (trompete).
Além de recriar com classe dois temas de John Coltrane, em sua "Uprising" Lovano remete ao "free jazz" de Ornette Coleman.
Gigantes do jazz também não faltam em "The Main Ingredient", o novo álbum de Shirley Horn. Joe Henderson (sax tenor) e Elvin Jones (bateria) estão entre os convidados da cantora e pianista.
Porém, em vez de gravar em um esfumaçado clube de jazz, Shirley preferiu fazer o disco em sua casa. Queria matar saudades dos tempos em que cozinhava para os músicos de seu grupo, após os shows.
O resultado dessa sessão doméstica, recheada de blues langorosos e baladas etéreas, é literalmente delicioso. A anfitriã e quituteira musical não deixa por menos: até inclui no encarte do CD a receita de seu "filé na cerveja".
Já "Long Ago & Far Away" -quarta aventura jazzística do rolling stone e baterista Charlie Watts- está mais perto de provocar bocejos do que água na boca.
A exemplo de seu disco anterior, Watts decidiu curtir um pouco de nostalgia. Revisita com seu quinteto de jazz outro lote de canções que costumava ouvir na infância.
O repertório, ressalte-se, é de primeira: clássicos de Gershwin, Cole Porter e Ellington. O problema está no convencionalismo dos arranjos, que as cordas melosas da London Metropolitan Orchestra só reforçam. Quem imaginaria que na pele de "jazzman" o stone se mostraria tão careta?

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