São Paulo, domingo, 1 de setembro de 1996
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Bancos empurram serviços a clientes

MILTON GAMEZ
JOÃO CARLOS DE OLIVEIRA

MILTON GAMEZ; JOÃO CARLOS DE OLIVEIRA
DA REPORTAGEM LOCAL

Quem não aceitar a oferta tem de tomar a iniciativa de cancelá-la; Procon registra queixas

As empresas do setor financeiro têm cultivado um hábito para conquistar novos clientes ou vender novos serviços para os que já fazem parte da clientela: pelos Correios, oferecem e entregam serviços não-solicitados.
A maioria aceita, mas alguns consumidores acabam irritados. Os clientes podem até sair ganhando, mas os bancos ganham mais. O caso mais comum envolve cartões de crédito.
Mesmo sem terem sido requisitados, os cartões chegam sorrateiros por baixo da porta, estampando o nome do cliente e já com direito a limite de crédito.
O Itaú, no mês passado, enviou cartões Itaú MasterCard para clientes especiais, com isenção da anuidade por seis meses. A Credicard, maior administradora de cartões do país, enviou recentemente para milhares de pessoas o cartão Ayrton Senna MasterCard. O Citibank também tem o mesmo hábito, bem como o Unibanco.
No ano passado, o Banco do Brasil remeteu nada menos que 1 milhão de cartões Ourocard Visa para seus clientes especiais.
Nos três casos, na linha do "quem cala, consente", quem não reclamasse estaria automaticamente aceitando o serviço.
Aplicação automática
A estratégia do "empurra-empurra" também inclui investimentos. Há um mês, o Bradesco iniciou a aplicação automática dos saldos dos clientes em conta corrente no FAQ Fácil, um fundo de renda fixa de curto prazo. O rendimento, para os clientes, é mínimo: 0,02% ao dia.
Meses antes, o Itaú fizera o mesmo. Ambos seguiram a trilha do Real, que aplica automaticamente os depósitos à vista de parte da clientela na poupança.
Em todos os casos, as administradoras de cartão e os bancos alegam que as pessoas não são forçadas a ficar com o serviço empurrado. Quem não quiser o cartão ou a aplicação automática pode ligar para o serviço de atendimento e cancelar a oferta, dizem. Aí é que começam os atritos com os consumidores inconformados.
Primeiro, porque as centrais de atendimento telefônico das instituições de varejo estão sempre ocupadas.
Segundo, porque aqueles que não protestam em tempo estão sujeitos a cobranças inesperadas, como as anualidades dos cartões.
Insatisfação registrada
O Procon, órgão estadual de defesa do consumidor, registra habitualmente a insatisfação com as instituições financeiras.
Em São Paulo, as reclamações contra os bancos aumentaram 168%, comparando-se os resultados dos primeiros quadrimestres de 1996 e de 1995, segundo estudo feito pelo Procon e entregue à Febraban (Federação Brasileira das Associações de Bancos).
Detalhe: no mesmo período de 95 contra 94, essas reclamações haviam caído 50%.
Segundo Dinah Barreto, supervisora da área de assuntos financeiros do Procon, de forma genérica, as empresas têm melhorado o seu atendimento depois do Código de Defesa do Consumidor, "mas os bancos têm piorado".
Processo pendente
Parte pequena das queixas têm origem na prática de empurrar serviços não-solicitados. É o caso do senhor Dinamérico Souza Campos, 81, aposentado.
Cliente "faz mais de 20 anos" de uma agência de CEF em Planalto Paulista (bairro da zona sul de São Paulo), ele reclama dos problemas causados com a transferência -"a minha revelia"- de recursos da conta corrente para fundos de investimento de 30 e 60 dias. O aposentado, que, confessa, "não tinha dado muita importância à transferência", viu seu cheque especial estourar o limite. Pior. A CEF passou a cobrar dele juros sobre saques a descoberto.
"Vou continuar cliente. Nunca tive problemas. Mas quero ser ressarcido", afirmou.
A assessoria da CEF, porém, tem outra versão do ocorrido.
Diz que os recursos, na realidade, não estavam na conta corrente, mas aplicados em fundos antigos -transferidos para os novos fundos. E que, de acordo com as novas regras, não existe mais o saque automático. Logo, argumenta a CEF, bastava que o senhor Dinamérico ligasse para pedir o débito que evitaria a cobrança de juros e tarifas.
O Procon não concordou com as explicações. O processo continua em andamento.

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