São Paulo, sexta-feira, 6 de setembro de 1996
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Os meios e os fins

LUÍS NASSIF

Em seu apostolado pela qualidade, o professor Vicente Falconi Campos -papa da Qualidade Total no Brasil- conta uma história exemplar.
Uma transportadora de Belo Horizonte estava com demanda 20% maior do que a oferta de veículos. Fez reunião para discutir a saída, de onde surgiu a proposta automática de aumentar a frota em mais 20%.
Contratado para assessorar a empresa, Falconi discordou. Qual é o problema? Atender à demanda ou aumentar a frota? Até poderia ser que a solução final fosse aumentar a frota. Mas o problema central era atender à demanda.
Decidiu-se mudar, então, o foco da análise para como atender à demanda.
Se um caminhão rodasse 24 horas por dia, sua capacidade total ideal seria de 720 horas por mês. Na frota, o tempo médio de rodagem era de 200 horas. Bastaria aumentar a utilização em 20% para resolver os problemas, sem novos investimentos.
Mudado o foco do problema, passou-se a analisar os pontos que impediam a maior utilização da frota. Por meio de levantamentos estatísticos foram constatados três problemas principais: demora para o caminhão ser atendido pela oficina; demora para ser atendido, depois que estava na oficina; e tempo parado em finais de semana.
Identificados os problemas, encontrou-se solução rápida.
Saúde
É uma história banal, mas que reflete cabalmente um dos grandes vícios da administração nacional, pública e privada: o de julgar que o problema está nos meios, e não nos fins.
O caso da Saúde é exemplar. Durante sua gestão, o ministro Adib Jatene considerou que o problema central da saúde era de falta de recursos. E não era. O problema central da saúde é "como atender melhor à população", explica Falconi. A partir dessa mudança de enfoque, a falta de recursos seria apenas um item a mais a ser considerado -mas não o item central. E se poderia iniciar um programa amplo, que significasse a melhoria da eficiência em todos os níveis.
O caso da Educação é outro. O governo Brizolla considerou que o problema da educação era a falta de escolas -ou seja, o problema estava nos meios.
O governo de Minas Gerais definiu que o problema era melhorar a gerência e reduzir os níveis de repetência.
Apesar da boa intenção e de tudo quanto foi gasto nos Ciacs, recente avaliação do Ministério da Saúde situou o ensino básico do Rio como dos mais fracos do país. E, apesar de ter colocado em prática apenas 10% do programa de qualidade -e dos salários indecentes das professoras-, o ensino de Minas foi considerado o de melhor nível.
No fundo, esse é um dos grandes óbices culturais a ser superado, para preparar o Brasil para entrar na briga da globalização.
Fundos sociais 1
A inclusão dos passivos públicos junto ao Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) nas moedas de privatização abre espaço para o primeiro passo efetivo em direção ao grande acordo nacional, entre Estados e Nação.
Depois de ter viabilizado a isenção do ICMS nas exportações e investimentos, ter encaminhado o conjunto de reformas do mercado de capitais, se conseguir viabilizar o processo de privatização com o FGTS de maneira eficiente, o ministro do Planejamento, Antonio Kandir, poderá inscrever seu nome na relação dos homens públicos que efetivamente fazem.
Fundos sociais 2
Da coluna de 12 de novembro de 1991: "Este quadro apenas reforça a importância de, daqui para a frente, proceder-se a alterações no processo de privatização, permitindo que os fundos sociais, reformulados, passem a participar dos leilões. Valorizam-se as estatais, e dá-se uma destinação mais justa e ética para o processo de privatização".
Gerência
Do economista argentino Miguel Angel Broda, respondendo o que faria se tivesse aceitado o convite para substituir Domingo Cavallo: "Incorporaria à equipe o melhor gerenciamento -não com economistas, mas com administradores profissionais".
Exército
Dos anos 60 aos 80, a segunda maior fonte de desgastes das Forças Armadas foi seu envolvimento com aventuras financeiras. O primeiro, foram as denúncias de torturas.
Os episódios Capemi e Baumgarten estão até hoje vivos na lembrança da opinião pública, prejudicando a imagem da instituição e dos militares que jamais saíram da linha em suas missões constitucionais.
Repetir essas incursões financeiras, a esta altura da vida nacional, seria um retrocesso indesculpável e um enorme risco à imagem do Exército.

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