São Paulo, sábado, 7 de setembro de 1996
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O Real e o bode

CLÓVIS ROSSI

São Paulo - O novo mapa social do país, divulgado pelo IBGE, permite adaptar ao Brasil a surrada história do bode.
Vamos lá: a situação social brasileira sempre foi indecente, antes mesmo que se iniciasse o prolongado período de superinflação. Esta fez o papel do bode.
Entrou numa sala já insuportavelmente ruim e adicionou uma complicação conjuntural a um quadro estrutural degradante.
Aí vem o Plano Real e tira o bode da sala. Volta-se ao quadro anterior, com a vantagem de que a sala inabitável tem um elemento (e um cheiro) a menos.
A situação, para os 10% mais pobres, melhorou apenas depois da vírgula (0,4 ponto percentual, na comparação de sua renda entre 1995 e 1993).
Para usar uma avaliação que foi feita pela deputada Maria da Conceição Tavares (PT-RJ), tempos atrás, o que fica evidente é que, menos do que redistribuir renda, o que o Real fez foi estancar o agravamento de uma situação já insustentável.
Não se trata de um efeito desprezível. Mas equivale, na medicina, a dar aspirina para tratar o câncer social brasileiro. Ou, no futebol, ao Bragantino, até agora sem um único ponto ganho no Campeonato Brasileiro, conseguir um empate com, digamos, o Fluminense, penúltimo colocado.
Não seria o caso de Bragança explodir de entusiasmo cívico.
O pior é que o governo que conseguiu tirar o bode da sala teria, em tese, crédito e espaço suficientes para ao menos iniciar um processo (palavra ao gosto do tucanato, frise-se) de terapia intensiva no doente Brasil.
Ficou nos emplastros, aqui e ali.
Agora, é torcer para que uma incipiente revisão de conceitos, em especial entre os gurus do tal Consenso de Washington, faça os governantes entenderem que o intervencionismo social do Estado não é tão pecaminoso como se decretou no auge da onda neoliberal.

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