São Paulo, sábado, 7 de setembro de 1996
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De uma vez por todas

CARLOS HEITOR CONY

Rio de Janeiro - A restrição veio de um amigo. Achou que eu exagerara ao escrever a orelha do novo livro de poemas do Thiago de Mello, "De Uma Vez Por Todas", que a Civilização Brasileira acaba de lançar. Na orelha, dizia que Thiago assumia "a expressão de um poeta universal".
O amigo, também amigo de Thiago, achava que eu pegara pesado, embora reconhecendo que o poeta percorrera as sete portas do mundo e está traduzido em diversas línguas. Mas nada tinha de universal, uma vez que vivia encafuado na floresta amazônica, há anos, e de lá não querendo sair.
Bem, para início de conversa, o tal amigo confundia as bolas. Eu não classificara a poesia de Thiago como internacional, mas como universal. Muita gente há que faz a mesma confusão, achando que universal é sinônimo de internacional. Ou que seja sinônimo de cósmico.
O conceito de universal está expresso na lógica aristotélica com uma clareza que atravessou séculos. Universal é "unum aptum inesse pluribus", ou seja, o uno que pode existir em muitos. (Devia citar em grego, mas os caracteres são outros e chega de erudição suspeita).
Há a sovada citação de Tchecov: "Escreva sobre a tua aldeia e descreverás o mundo". É outra maneira de ser universal. Na medida em que Thiago, com sua já extensa obra poética, atingiu a essência da emoção e da reflexão, não importa que ele se detenha no ato de fecundação de dois peixes do rio Andirá ou numa mesa de bar do Rio-anos-50, acompanhando um chorinho de Pixinguinha.
A universalidade do poeta -de qualquer poeta- é a de ser um em muitos, ainda que só fale numa língua e de um só lugar. Evidente que entre o rio Arno de Dante e o rio Andirá de Thiago há distâncias de tempo e espaço.
Ambos atingem o universal quando conseguem captar, com a magia de uma palavra, a banalidade da dor ou da vulgaridade do gozo.

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