São Paulo, domingo, 8 de setembro de 1996
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Meninas brasileiras vão ao Paraguai para se prostituir

65% das prostitutas têm menos de 18 anos

JOSÉ MASCHIO
DA AGÊNCIA FOLHA, NO PARAGUAI

Com uma bala no peito, a menina S.H., 16, foi levada à Santa Casa Monsenhor Guilherme, em Foz do Iguaçu (PR), em 31 de agosto passado. Brasileira descendente de alemães, ela estava no Paraguai quando foi atingida por um tiro abaixo do seio esquerdo.
O boletim de ocorrência, obrigatório em casos de ferimento a bala, registra que ela foi ferida durante um assalto no Paraguai, em Hernandárias.
Na paraguaia Ciudad del Este, na fronteira com Foz, a polícia tem outra versão: S.H. é uma prostituta e foi baleada num prostíbulo em Hernandárias, quando o cliente começou a discutir o preço do programa. O resultado da briga foi a morte da cafetina -também brasileira- e a hospitalização de S.H.. Inútil procurar o endereço da garota registrado no boletim de ocorrência -é falso.
S.H. é uma das centenas de meninas brasileiras que cruzam a fronteira entre o Brasil e o Paraguai, em Foz do Iguaçu (656 km a oeste de Curitiba), para se prostituir.
Pesquisa de Luz Marina Acosta, consultora do Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância) no Paraguai, aponta que mais de 200 brasileiras (65% delas menores de 18 anos) são prostitutas em Ciudad del Este, capital do Departamento (Estado) de Alto Paraná.
Segundo Acosta, nos municípios do interior de Alto Paraná o número de prostitutas brasileiras "menores de 18 anos" é cerca de 1.500.
Ela estima que sejam mais de 70% das 2.000 brasileiras prostituídas nos municípios deste departamento, fronteiriço com o Brasil.
Maioria de brasileiras
Percorrendo os municípios de Hernandárias, Santa Rita, Naranjal e as rodovias 6 e 7, a Agência Folha encontrou uma proporção de dez brasileiras para cada paraguaia nos prostíbulos locais.
Nesses municípios, as meninas brasileiras são as mais procuradas pelos clientes, na maioria brasileiros radicados no Paraguai como agricultores ou caminhoneiros que fazem o transporte internacional.
Uma rede de cafetinas e proprietários de bares, lanchonetes e restaurantes se encarrega de manter o fluxo de novas meninas para esses locais.
Para isso, fazem o convite direto para a prostituição -para as que já são prostitutas no Brasil- ou iludem com a promessa de empregos como garçonetes, para aquelas que serão oferecidas como "virgens" aos clientes.
Célia Pereira dos Santos, a "Xuxa", é apontada por donos de bordel (quase todos brasileiros) e meninas como uma das cafetinas mais ativas na região de fronteira.
Para Sérgio Richidt, dono de um salão de baile à margem da rodovia 6, no centro de Santa Rita (130 km a sudoeste da fronteira com o Brasil), Xuxa "tem a capacidade de trazer meninas novas, todas com menos de 15 anos, as preferidas dos clientes".
Xuxa seria a responsável por levar as menores C.F., 13 -resgatada pelo Movimento Nacional de Defesa dos Direitos Humanos em um prostíbulo de Santa Rita-, e Débora Behrem, 14, que morreu em 1º de agosto em um acidente na estrada, acompanhada de cliente.
Richidt nega que seu estabelecimento seja um local de prostituição. "O pessoal vem para dançar, as minhas meninas são garçonetes e o que fazem depois do trabalho é problemas delas", afirma.
As suas funcionárias -seis, no dia em que a reportagem da Agência Folha visitou o local- eram todas menores de 18 anos.
Propina
Luiz Moreira, que mantém 9 brasileiras e 3 paraguaias (10 menores de 18 anos) em seu prostíbulo em Encruzo Naranjal (a 170 km da fronteira com o Brasil), afirma que faz parte do negócio o suborno semanal à Polícia Nacional do Paraguai. Moreira disse que cada menina custa R$ 5 (10 mil guaranis) por semana "de propina para a polícia não perturbar".
A existência da cobrança dessa taxa semanal pela polícia também apareceu no relatório feito pelo Unicef paraguaio no Encontro sobre Abuso Sexual, realizado recentemente em Estocolmo, na Suécia.
A Polícia Nacional do Paraguai nega a cobrança. Segundo Gustavo Duarte, subcomissário da 2ª Delegacia de Ciudad del Este, a cobrança "de taxa para permanência em prostíbulos é coisa do passado; hoje, a polícia está empenhada em combater a exploração sexual de meninas no país".

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