São Paulo, domingo, 8 de setembro de 1996
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Pesquisas a granel

JANIO DE FREITAS

A pesquisa Ibope-MCI paga pela Petrobrás, porque a Presidência da República queria negar a demonstrada recusa do eleitorado à reeleição, gerou inesperada quantidade de indagações e sugestões, parte sobre as pesquisas em si, parte sobre a necessidade de inspeções que atestassem a veracidade ou desmoralizassem a fraudulência da estatística tão influente no eleitorado.
Além de resultar mal para a Presidência, pela evidenciação da manobra, a pesquisa Petrobrás-Ibope-MCI teve a utilidade de advertir maior número de pessoas para a conveniência de cautela diante de pesquisas. Mas não há muito como reagir às suspeitas de fraudulência.
É sempre possível a uma empresa de pesquisas demonstrar qualquer resultado estatístico. No caso das sondagens por consulta pessoal, o resultado pretendido pode ser alcançado com a simples alteração do número de consultas. Digamos que a pesquisa deve referir-se a 2.000 pessoas ouvidas e apresentar, no resultado, 35% de opiniões favoráveis a dado candidato ou produto. Se nas primeiras 2.000 consultas não houver os 35% desejados, a consulta continua até obter as 700 opiniões que fariam aquele percentual. Depois é só usar 1.300 cartões com respostas diferentes, para documentar que fez 2.000 consultas, e jogar fora os excedentes. Se quiser, ainda distribui também os 1.300 no resultado segundo percentuais predeterminados.
Qualquer auditoria da pesquisa encontraria, certinhos, 2.000 cartões, com 35% de respostas iguais, e o restante tal como divulgado. E, no entanto, a pesquisa não seria mais do que uma fraude muito bem paga. As pesquisas ditas telefônicas até dispensam exemplificação. Os métodos não alteram o fato gravíssimo de que a facilidade para a falsificação produziu uma indústria de pesquisas fraudulentas, cada vez maior e mais próspera.
É claro que há empresas de pesquisa confiáveis. Há, até, aquelas que tanto fazem pesquisas com competência, como fazem com fraudulência, dependendo da vontade do cliente ou do grau de risco para o prestígio de sua marca. O melhor ainda é receber com reserva as pesquisas que mostrem saltos muito grandes em muito poucos dias, ou resultados que nenhum fato explica nem como hipótese possível, ou as pesquisas que destoam muito das que se mostram mais coerentes umas com as outras.
Em resumo: pesquise as pesquisas.

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