São Paulo, domingo, 8 de setembro de 1996
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Jovem troca arma por ferramenta no Bronx

GILBERTO DIMENSTEIN
DE NOVA YORK

Estampadas em dez jovens, as tatuagens e cicatrizes visíveis no rosto são as recordações dos tempos das gangues, drogas e brigas nas ruas do South Bronx, em Nova York (EUA).
"Ganhei um sentido de vida", diz Yokohmo Santiago, 22, filho de imigrantes de Porto Rico.
Afastados da delinquência, eles estavam armados, na manhã de quinta passada, apenas de ferramentas para reformar um prédio.
Aquele grupo faz parte de uma das experiências sociais mais festejadas, escolhida pela ONU (Organização das Nações Unidas) como um dos dez melhores exemplos de recuperação urbana do mundo.
Uma das consequências: apesar de ainda estar alto, o índice de crimes caiu pela metade nos últimos cinco anos.
Bairro de classe média branca até a década de 50, o South Bronx virou símbolo do caos das grandes cidades americanas, com seus prédios, templos e escolas abandonadas, lixo e desempregados pelas ruas.
As guerras de gangues, tráfico de drogas e assassinatos inspiraram filmes policiais retratando o caos urbano -serviu de cenário para "A Fogueira das Vaidades", filme baseado em livro do escritor Tom Wolfe, onde um bem-sucedido executivo acaba com sua vida por ter se perdido e atropelado um negro no bairro.
Reformas
Os dez jovens ajudavam a produzir um cenário até há pouco tempo inimaginável. Num projeto criado pelos moradores, batizado de "Banana Kelly", 2.000 casas e apartamentos foram reformados, ganhando fachadas limpas e coloridas.
Banana Kelly é o nome da rua em que o projeto reformou o primeiro prédio, onde, hoje, existe em uma das paredes -como marco histórico- estátuas de meninas pulando corda.
Gangues perderam força, e, hoje, os moradores comemoram uma redução de 50% nos crimes nos últimos cinco anos. "A situação obviamente não é fácil, mas perto do que era virou um paraíso", diz a dominicana Rafaela Menendez, assistente social que mora em South Bronx.
Prédios abandonados
Eles conseguiram, no início da década de 80, que o governo cedesse os prédios abandonados. Reformados, eram alugados para famílias preocupadas em trabalhar e educar seus filhos.
Banana Kelly não era apenas uma idéia urbanística, mas educacional. Tentaram atrair os integrantes de gangues, o que, de um lado, reduziria a tensão nas ruas e, de outro, obteria mão-de-obra.
Ofereceram um salário e chance de aprender uma profissão por meio das reformas dos prédios; ao mesmo tempo, recebem atendimento psicológico e assistencial.
"Incrível a satisfação deles quando reformam um prédio e podem mostrar aos amigos. Eles acabam virando bons exemplos e mostram a seus colegas que existe saída. Temos uma fila de pessoas querendo entrar em nosso programa", afirma Augie Demera, que comanda os programas educacionais do projeto.
Como seus alunos, ele se envolveu com gangues. "Sei como eles pensam, sentem e agem. E sei que se você der a oportunidade, muitos vão tentar", afirma.

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