São Paulo, segunda-feira, 9 de setembro de 1996
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

'Imposto alto eleva preço e contrabando'

FREDERICO VASCONCELOS
DO EDITOR DO PAINEL S/A

Numa recente manifestação contra a violência, em São Paulo, as pessoas mostravam cartazes com fotos de pistolas e a seguinte frase: "Armas não matam pessoas. Pessoas matam pessoas".
O slogan coincide com a tese dos fabricantes de armas. Na opinião do engenheiro Carlos Alberto Paranhos Murgel, presidente da Associação Nacional da Indústria de Armas, "a arma é um produto, como o automóvel".
"Na mão de um drogado, de alguém sem parâmetros, o automóvel se torna uma arma", diz Murgel, que preside a Forjas Taurus.
Ele nega que a frase tenha sido sugerida pelos fabricantes de armas. É inspirada, diz, em afirmação do papa João Paulo 2º, depois de ferido em atentado em 1981.
Para Murgel, o aumento da criminalidade resulta da crise econômica e social. Associar o aumento da violência à fabricação de armas é "tapar o sol com a peneira", diz.
O presidente da Taurus conversou com a Folha, por telefone, de Porto Alegre, na última quarta-feira. Por razões de segurança, Murgel pediu para não ser fotografado. "Não sou fotogênico", diz.
(FV)
*
Folha - Como fabricante de armas, como o sr. vê o movimento contra a violência?
Carlos Alberto Paranhos Murgel - Estão fazendo uma tempestade em copo d'água. As vendas de armas no Brasil estão caindo. O problema é mais profundo. É a crise econômica, a má distribuição da renda. Não podemos transformar o cidadão de bem num criminoso por estar tentando se proteger. É impossível exigir do governo onipresença, um policial por habitante. É necessária uma lei que conceda o direito de ter armas.
Folha - O sr. anda armado?
Murgel - Tenho arma em casa. Não advogo que se saia pela rua com arma. A não ser que seja alguém bem treinado, que conduza valores e que tenha curso de tiro.
Folha - O sr. tem sido "cobrado" ou já sofreu algum constrangimento por fabricar armas?
Murgel - Não. Até hoje, não. Não teria sentido. Sou dirigente de uma empresa que, nas boas épocas, empregava mais de 2.000 pessoas (atualmente emprega 924).
Folha - Que contribuição a sua empresa oferece para reduzir a violência?
Murgel - Temos ajudado a reformar e equipar delegacias em Porto Alegre e a equipar as academias de tiro das polícias militares.
Folha - O sr. recomenda aos funcionários a posse de armas? Como a questão é tratada na empresa?
Murgel - Não é tratada. É do alvitre de cada um. Não é permitido o uso de armas na companhia. E há regras e cuidados na produção.
Folha - Como surgiu a autorização para venda subsidiada de armas a policiais militares? Houve lobby da indústria? A arma que matou PC Farias havia sido financiada a um policial...
Murgel - O caso de Alagoas é isolado. Não vou dizer que não tenha acontecido em outros lugares. Em todas as profissões existem bons e maus. Se um policial faz uso indevido, deve responder por isso. Esses homens, infelizmente, não são remunerados decentemente. São forçados a dar serviço sem ter arma. Junto com as autoridades, encontrou-se uma forma de permitir que esses cidadãos, que trabalham para defender a sociedade, pudessem comprar armas. Houve o parcelamento. A maioria dos policiais não tem nem sequer munição para pôr nas armas.
Folha - Por quê?
Murgel - No Brasil, o preço é cinco ou dez vezes maior do que no exterior. Há um monopólio da CBC (Companhia Brasileira de Cartuchos). Isso estimula o contrabando de munição.
Folha - Qual é o peso do contrabando e do mercado paralelo?
Murgel - Hoje em dia, é considerável. As armas no Brasil têm preço alto por causa dos impostos.
Folha - Qual é o perfil do comprador de armas no Brasil?
Murgel - Não tenho esse perfil. Via de regra, é uma pessoa da classe média ou alta, com poder aquisitivo. Um revólver calibre 38 custa de R$ 250,00 a R$ 260,00.
Folha - O sr. é a favor de uma campanha de desarmamento?
Murgel - Os criminosos devem ser desarmados. O que está sendo feito pelo governo é correto. Pena para quem portar arma sem ter porte. É um avanço.
Folha - O sr. já foi vítima de alguma violência?
Murgel - Graças a Deus, não.

Texto Anterior: Veja quem são os fabricantes
Próximo Texto: Rápida recuperação; Semestre azul; Volume no negócio; Adubando o capital; Associado estatal; Gasto anunciado; Aposta no futuro; Novos horizontes; Marketing Vip; Rota asiática; Sem brincadeira; Batalha perdida; Separação litigiosa; Mudando a clientela; Mercado competitivo; Em Washington; Do governo; Qualidade total; Olho no luxo
Índice


Clique aqui para deixar comentários e sugestões para o ombudsman.


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.