São Paulo, sexta-feira, 13 de setembro de 1996
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A pasta de Gustavo Franco

LUÍS NASSIF

Em vez da pasta cor-de-rosa, o "potin" do momento é o documento do diretor da área internacional do Banco Central, Gustavo Franco, sobre os rumos da economia. Já é um avanço.
O mal dos embates acadêmicos, em geral, reside nessa tendência de considerar os meios (as idéias) mais relevantes que os fins (os resultados). Nenhum argumento válido do lado oposto é aceito, para não enfraquecer as próprias premissas. Com isso, prejudica-se a capacidade de observação da realidade e o pragmatismo.
Foi assim nessa patacoada contra o economista John Williamson, pai do tal "consenso de Washington" -por parte de pessoas que assinariam tranquilamente suas recomendações se ele não tivesse por nome John e por sobrenome Williamson.
Da mesma maneira, brilhantes acadêmicos passaram pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) sem conseguir as novas formas de atuação do banco. Justamente porque não centravam suas análises na finalidade maior: resolver os problemas de sua clientela, do setor público e privado.
Bastou dirigir a ação do banco para a solução de problemas concretos para, da própria prática, emergir seu novo perfil.
Pragmatismo
O mesmo ocorre com ações de política industrial. Há que se levar em conta, previamente, alguns princípios básicos irreversíveis, como o primado da competição, a modernização gerencial e das formas de controle acionário, a igualdade de oportunidades, a resistência a formas de subsídios, a criação de ambientes econômicos que permitam o florescimento de competências etc.
Estando claros esses princípios gerais, toda ação de governo deve ser voltada pragmaticamente para resolver problemas.
Na definição de políticas de desenvolvimento, há dois modelos econômicos em jogo. O americano -criar condições macroeconômicas e deixar o resto por conta do mercado- e o japonês -montar estrutura de planejamento estatal que ajude a coordenar e dirigir ações privadas.
O Brasil é grande demais e (felizmente) democrático demais para permitir a repetição do velho vício de o governo definir os grupos a serem privilegiados. Mas nem por isso deve-se abrir mão da capacidade do Estado de coordenar esforços.
O problema da discussão acadêmica é centrar-se em modelos fechados e não admitir um mix voltado para a solução de problemas concretos.
Autopeças
Tome-se o caso do setor de autopeças. Pelo modelo "franquista", o governo que abra o mercado e deixe o setor ao deus-dará.
Pelo modelo intervencionista, que se feche o mercado, subsidiem-se as empresas e deixe-se tudo como está.
Se, de um lado, a maior parte do setor é composta por empresas familiares, pouco capitalizadas e gerencialmente anacrônicas, por outro lado, dentro da competição global, é importante que países disponham de um setor com capacidade autônoma de pesquisa e desenvolvimento.
É justamente por isso que as ações não podem se basear no manual. O governo pode exercer papel coordenador, de reestruturação, e deixar o setor apto a operar em uma economia competitiva.
O modelo está dado: numa ponta, fusão de empresas concorrentes para ganhar escala. Na outra, criação de mecanismos de investimento para capitalizá-las. Para tanto, profissionalização e transformação das empresas em modernas sociedades anônimas.
Por questões dogmáticas, vai-se permitir que empresas quebrem, que haja um amplo desperdício de investimentos já realizados, de empregos oferecidos e de tributos pagos?
Tiro torto
É maliciosa a proposta do senador Antônio Carlos Magalhães (PFL-BA) de obrigar os bancos que utilizam os recursos do Programa de Estímulo à Reestruturação e ao Fortalecimento do Sistema Financeiro Nacional (Proer) a manter a estabilidade dos bancários por dois anos.
Mesmo com possibilidades de ajuste no tamanho da rede, a solução para o Banespa seria difícil. Com essa exigência, será impossível.
A pretexto de defender empregos, o que o senador pretende é dar um xeque na tentativa de solução para o caso Banespa. E garantir o desemprego de todos os banespianos.

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