São Paulo, terça-feira, 17 de setembro de 1996
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Produção africana ganha destaque

LÚCIA NAGIB
DA EQUIPE DE ARTICULISTAS

É lugar comum dizer que o Brasil -a maior diáspora negra do mundo- desconhece o cinema africano. Muitos lamentam esse fato, mas poucos fazem algo para revertê-lo. É, por isso, louvável a iniciativa inédita da Mostra Internacional de Filmes (antiga Mostra Banco Nacional) de incluir, neste ano, o evento "Imagens Africanas", sob curadoria de Vik Santos.
Não se trata de uma simples amostra do cinema eminentemente autoral que se faz na África e que há três décadas se tornou objeto de estudos e distinções em festivais da Europa e outras partes do mundo.
A seleção abrange trabalhos dos papas do cinema negro, Ousmane Sembène e Souleymane Cissé, e filmes de talentos como Djibril Diop Mambèty e Idrissa Ouédraogo.
O prolífico escritor senegalês Ousmane Sembène, na febre dos movimentos de independência dos anos 60, foi pioneiro em trocar a pena pela câmera, numa tentativa de se aproximar de uma população em grande parte iletrada.
Com "Borom Sarret" (63), não só lançou a pedra inaugural do cinema subsaariano como configurou uma das imagens mais significativas do conflito África-Europa: o caos kafkiano em que a burocracia dos colonizadores mergulhou as civilizações africanas.
A mostra inclui "Guelwaar" (92), último trabalho de Sembène, que se volta para o choque entre diferentes tradições religiosas.
O mailnês Souleymane Cissé é outra figura quase mitológica. Seu "Yeelen" é considerado o melhor filme já feito na África. A razão de tanto fascínio parece residir na habilidade com que conseguiu conjugar a "magia" tecnológica do cinema com a magia das lendas do povo Bambara, do Mali.
Mas seu último trabalho, "Waati" (95), incluído na mostra, deixa o misticismo em prol da discussão política, ao traçar o retrato de uma sul-africana que foge do apartheid e acaba por se engajar na luta em favor dos tuaregues do Mali.
"Hyènes", de Djibril Diop Mambéty (Senegal), "Samba Traoré", de Idrissa Ouédraogo (Burkina Faso) e "Macadam Tribu", de José Laplaine (Zaire), comprovam a predominância da África francófona na mostra, natural em face dos programas específicos de incentivo ao cinema africano desenvolvidos pela França.
Uma única e nobre exceção se destaca: "Os Olhos Azuis de Yonta", dirigido por Flora Gomes, de Guiné Bissau, que tenta contrapor à imagem da "África que chora", disseminada no resto do mundo, a de uma "África que ri".

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