São Paulo, terça-feira, 24 de setembro de 1996
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Estado e política urbana

SAMUEL KRUCHIN; DENIO BENFATTI

SAMUEL KRUCHIN
DENIO BENFATTI
Não são poucas as vezes em que soluções adotadas para o equacionamento de problemas de natureza econômica, aparentemente saneadoras, inibem alternativas de repercussão social mais vasta e conduzem a resultados imediatistas e pouco desejáveis. Refiro-me à questão urbana e ao acervo de áreas pertencentes ao Estado, ou às suas empresas, localizadas nas principais cidades e colocadas sob a perspectiva de privatização.
A proposta de incorporação da Fepasa ao patrimônio federal (RFFSA), como parte da negociação da dívida do governo junto ao Banespa, é um exemplo típico de solução imediatista e de perda de oportunidade histórica: os grandes vazios deixados pela ferrovia nas áreas centrais das médias e grandes cidades configuram hoje um conjunto capaz de redesenhar a qualidade de vida urbana em todo o interior do Estado.
Com o crescimento urbano, o esvaziamento e a transformação da atividade ferroviária, essas áreas, hoje centrais, foram transformadas em imensos pátios desocupados e territórios desertificados, produzindo uma cisão profunda no espaço e a necessidade de grandes investimentos públicos para religar tecidos urbanos por meio de pontes e viadutos. Tais espaços colocam-se hoje como um problema de solução distante. São geridos pelo Estado, ou por empresa por ele controlada, escapando às ações de planejamento municipal.
Campinas, Marília, São Carlos, São Paulo... São milhões de metros quadrados cuja reintegração à tecitura urbana permitiria reduzir custos com a utilização de infra-estrutura já instalada; permitiria o surgimento de grandes parques urbanos; tornaria desfrutável um importante patrimônio arquitetônico, convertendo-o em centros de cultura ou comércio. Enfim, uma possibilidade de redesenharmos a urbanidade a partir de seu próprio centro, de seu lugar simbólico maior, de recolocarmos a cidade como lugar da cidadania.
Impõe-se, portanto, uma racionalidade ordenadora, consubstanciada por projetos urbanos específicos, coordenados pelo governo do Estado, numa ação conjunta entre Estado, municípios e o empresariado, evitando a fragmentação e o loteamento desses espaços em soluções oportunistas. Essa racionalidade, socialmente necessária, é um atributo do governo do Estado, o qual não mostrou, até o momento, qualquer sinal de consciência ou sensibilidade.

Samuel Kruchin, 41, arquiteto e urbanista, é professor do curso de especialização em urbanismo moderno e contemporâneo da Puccamp (Pontifícia Universidade Católica de Campinas).
Denio Benfatti, 46, engenheiro, doutor em urbanismo pela Universidade de Paris (França), é professor do Departamento de Planejamento da Puccamp.

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