São Paulo, quinta-feira, 26 de setembro de 1996
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Fumo ameaça 900 mil gestações no país

AURELIANO BIANCARELLI
ENVIADO ESPECIAL A BELO HORIZONTE

Cerca de 900 mil gestações por ano no Brasil são seriamente prejudicadas pelo fato de a mãe fumar durante a gravidez. É o maior contingente de bebês em risco do mundo, em números absolutos.
Desse total, mais de 100 mil gestações são abortadas.
Os bebês que chegam ao final da gestação nascem com peso menor e têm duas vezes mais chances de morrer no parto. Os que ultrapassam o primeiro ano de vida -período em que correm risco 50% maior de morrer que os outros- podem ter dificuldade de acompanhamento na escola.
O número de crianças ameaçadas pelo fumo foi estimado pelo médico e professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) Mário Rigatto, pesquisador do CNPq que há 20 anos estuda os efeitos do cigarro. Os dados foram apresentados no Congresso Brasileiro de Pneumologia, ontem, em Belo Horizonte.
No Brasil, segundo dados do IBGE (Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) de 1994, foram registradas 3,5 milhões de crianças.
Rigatto tomou como base um levantamento do instituto Worldwide, uma organização não-governamental de Nova York (EUA) que calculou em 800 mil o número de crianças que nasciam de mães brasileiras fumantes em 1980. Na época, o instituto estimou em 20% a porcentagem de mulheres que fumavam na gravidez no Brasil.
Um estudo concluído agora com 800 gestantes de sete maternidades de Porto Alegre confirmou que 19,5% delas fumaram durante os nove meses da gravidez. "Todas as gestantes fumantes sabiam que o cigarro prejudicava seu bebê", disse Isabel de Oliveira Netto, pesquisadora da UFRS. "Mas não conseguiam parar de fumar."
A diferença aparece no nível cultural das mães. Segundo o estudo, só 9,2% das gestantes com segundo grau e nível superior fumaram durante toda a gravidez. Entre aquelas com menor escolaridade, a porcentagem subiu para 27%.
Em outro trabalho, a mesma autora mostrou que as mães que fumam na amamentação transmitem a seus bebês o equivalente em nicotina a três cigarros por dia.
Segundo Rigatto, há países do 3º Mundo onde a taxa de gestantes que fumam é maior que a do Brasil. O número de 900 mil gestações/ano mantém o país como campeão de "bebês fumantes passivos".
A qualidade de vida das brasileiras estaria expondo ainda mais essas crianças.
Os pesquisadores da UFRS observaram que as mulheres -justamente as que têm mais filhos-, fumam duas vezes mais que as de classe média, só podem comprar os cigarros mais baratos (com mais nicotina e alcatrão) e fumam o cigarro até o fim, consumindo sua parte mais tóxica.
Para agravar, vivem em habitações apertadas e coletivas, onde a fumaça do cigarro atinge diretamente as crianças.

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