São Paulo, sábado, 28 de setembro de 1996
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"Foi um privilégio ter sobrevivido"

EVA JOORY
DA REPORTAGEM LOCAL

O canal de TV a cabo HBO exibe hoje, às 22h30, o documentário inédito "Lembranças de uma Sobrevivente", de Kary Antholis.
O filme, baseado no relato de Gerda Weissmann Klein, foi o vencedor do Oscar do ano passado na categoria curta-metragem.
"Lembranças de uma Sobrevivente" é uma co-produção entre a HBO e o Museu do Holocausto dos EUA. Sua realização marcou a comemoração dos 50 anos do fim da Segunda Guerra Mundial.
O filme faz parte dos planos da emissora que quer investir em novas produções mensais.
Gerda Klein, 72, foi a única sobrevivente de uma família judia de Bielsko, na Polônia. Ela tinha 15 anos quando seu país foi invadido pelos alemães.
Gerda e o marido, Kurt Klein, chegaram anteontem ao Brasil para falar sobre o filme.
Durante a entrevista concedida pelo casal em São Paulo, Gerda Klein se disse bastante emocionada pelo interesse que as pessoas têm demonstrado por sua história: "Minha história não é única, e são raras as que têm um final feliz. Mas fico feliz por ter a oportunidade de falar pelos que não estão aqui", disse.
Hoje ela viaja pelo mundo levando seu testemunho: "Me sinto privilegiada por ter sobrevivido. Todos queriam ter sobrevivido. Por isso me sinto na obrigação de contar minha história".
Alternando o relato de Gerda Klein com imagens de arquivo em preto-e-branco e gravações atuais nas cidades citadas, o filme traz imagens de época e depoimentos comoventes.
Depois de se esconder no porão de sua casa, Gerda perdeu seu irmão, preso pelos alemães, e, dois anos depois, foi separada dos pais. Passou três anos presa em campos de concentração nazistas.
"Tenho lembranças muito tristes. Perdi toda a minha família. Mas ao mesmo tempo em que viajo pelo mundo divulgando os horrores da guerra, faço questão de falar também sobre amizade. Conheci minhas melhores amigas nos campos de concentração."
Em 45, Gerda participou da Marcha da Morte com 2.000 mulheres, que cruzaram a pé, em três meses, a fronteira da Polônia e o sul da ex-Tcheco-Eslováquia.
O que a salvou durante a caminhada pela região gelada foi ter usado botas de esqui, um conselho de seu pai: "Entendi então porque ele me mandara usar botas de esqui em pleno mês de junho".
A marcha foi interrompida graças à invasão dos aliados. Das 2.000 mulheres que fugiram, apenas 150 sobreviveram. Gerda perdeu suas melhores amigas e, entre a vida e a morte, conheceu seu futuro marido, Kurt Klein, um soldado do batalhão aliado.
"Fui libertada um dia antes de fazer 21 anos. A primeira pessoa que vi na minha frente foi Kurt. Foi amor à primeira vista", conta.
"Não sei como ele se apaixonou por mim. Eu estava com uma aparência assustadora. Tinha perdido 20 quilos e meus cabelos estavam todos brancos."
Sobre o fato de o documentário ter sido o vencedor do Oscar, Gerda disse que foi uma forma de reconhecer a verdade da sua história: "Foi um alívio poder revelar para mais de um milhão de pessoas o que ficou preso dentro de mim durante anos".

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