São Paulo, quinta-feira, 2 de janeiro de 1997
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"Comunicando o fracasso"

GUSTAVO BERG IOSCHPE
ESPECIAL PARA A FOLHA

Para quem não passou, o período pós-vestibular é traumático. Todo mundo -todo o mundo mesmo- vem perguntar como é que foi, e a sua auto-estima vai se despedaçando à medida em que mais desses chatos vêm tripudiar seu insucesso.
Então aqui vai a receita para não se incomodar mais do que o necessário: recolha-se em algum lugar inóspito logo depois do vestibular e comunique sua sorte por carta. Mas não é qualquer carta, não. Aí vai o modelo infalível:
"Queridos Papai e Mamãe:
Antes de começarem a ler, por favor sentem-se. Não precisam se preocupar, agora já estou bem. A fratura do crânio e a concussão de quando eu pulei pela janela da casa que estava pegando fogo agora já estão sarando.
Eu só fiquei duas semanas no hospital, e a minha visão já está voltando ao normal. Felizmente, um frentista viu o fogo e chamou uma ambulância para me socorrer.
Ele foi supersimpático, veio me visitar no hospital e me convidou para morar no barraco dele. Já que a casa foi destruída pelo incêndio, eu aceitei.
Nos apaixonamos profundamente e vamos nos casar. Ainda não sei a data, mas vai ser antes de a barriga começar a aparecer (sim, estou grávida). Eu sei o quão felizes todos vão ficar com esse netinho. Não nos casamos ainda porque o Janjão (não é lindo o nome dele?) está com uma doença contagiosa, e estou evitando riscos para o bebê. O Janjão é muito querido, apesar de não ter terminado o primeiro grau e não ser muito fino. Tenho certeza de que o fato de ele ser de uma cor diferente da nossa e de outra religião não vai causar nenhum problema para vocês, que sempre foram tão tolerantes.
Agora que vocês já estão sabendo de tudo, deixe eu contar a verdade. Não teve incêndio nenhum, eu não tive fratura ou concussões, eu não estou grávida e o Janjão não existe. Só estou escrevendo para dizer que eu não passei no vestibular, e queria que vocês enxergassem isso na perspectiva apropriada."
Pronto, pode apostar que vão até fazer festa quando você chegar.
*
Encerra-se hoje o Fovest-97 e, com ele, o nosso monólogo a dois. Como dizem em filme de quinta categoria, "Espero que tenha sido tão bom pra você quanto foi para mim".
Aos aprovados, os parabéns. Aos que não tiveram tanta sorte, não desanimem. Até que mude esse sistema injusto, fica -infelizmente- o consolo de que, como dizia na primeira coluna, vestibular é como Carnaval: tem todo ano.

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