São Paulo, sexta-feira, 10 de janeiro de 1997
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Terra de conflitos

JOSÉ CARLOS PRADO

E ste livro pretende e consegue tornar acessível ao leigo a tabela periódica dos elementos químicos. Trata-se de um objetivo perfeitamente válido, uma vez que essa tabela, na opinião geral dos químicos, é a mais importante ferramenta para o conhecimento das transformações da matéria.
Atkins apresenta suas propostas de um modo que torna a leitura fácil, atraente e instrutiva. Sem presumir conhecimentos prévios de química, requer apenas que o leitor tenha curiosidade científica, seja capaz de aguçá-la e estabeleça associações relevantes. Com muita propriedade, ele recorre a outras ciências (por exemplo, a geografia e a história) para relacionar idéias e levar o leitor a refletir sobre a importância da tabela periódica -"princípio único, importante e unificador da química"-, o que deve despertar o interesse para novas leituras sobre o assunto.
Traçadas as analogias, não é difícil associar a tabela periódica a um vasto continente, cujas regiões são constituídas de famílias, períodos ou mesmo grupos de átomos. Participando dessa "jornada à terra dos elementos químicos", o leitor fará uma excursão por todo o continente, que permitirá evidenciar, pelo menos, duas importantes realidades. A primeira será a diversidade entre as regiões extremas do continente: uma região árida, pouco fértil, à leste, contrastando com uma região exuberante, de grande produtividade, à oeste. Trata-se dos gases nobres, à direita, e da região metálica, à esquerda da tabela periódica.
A segunda realidade que o viajante observará ao visitar, por mais tempo, as diferentes regiões do continente é que são sutis as diferenças entre regiões limítrofes, são pequenas as variações no tipo de solo, no clima, na fertilidade dessas regiões, podendo mesmo passar despercebidas a um viajante mais desatento. Em outras palavras, a grande diferença de propriedades entre um não-metal e um metal deve-se a pequenas diferenças de comportamento entre átomos vizinhos num mesmo período da tabela periódica.
Será possível estender sua viagem para conhecer ilhas próximas ao continente. Assim, ao norte, poderá examinar uma ilha pequena, única, isolada, porém extremamente produtiva, que representa o hidrogênio. Também poderá visitar dois arquipélagos, ao sul. Um deles, já produtivo, embora ainda em exploração, promete muito quando melhor inspecionado. Já o outro arquipélago é uma região perigosa, com potentes vulcões prontos a entrar em atividade. Eles são, respectivamente, os elementos lantanídios e actinídeos.
O excursionista deve ser curioso e analisar as potencialidades de cada região: regiões carboníferas, de reservas metálicas, formadas de gases, dois importantes rios, entre outras. Com essa analogia, conhecerá algo sobre os metais (por exemplo, o alumínio, o ferro, o cobre, o zinco, o mercúrio, o cálcio, o magnésio) e notará sua importância capital para os seres humanos. Verá a influência do relevo de uma região no tipo e no produto da sua vegetação. Poderá, então, predizer a forma, o gosto e o perfume de um determinado produto. Torna-se claro, assim, que a posição de um átomo na tabela periódica deve indicar uma série de propriedades desse átomo.
Durante a viagem pelo continente, será possível observar regiões bem mais desenvolvidas, capazes de fazer substanciais aprimoramentos em seus produtos. Aqui o leitor terá uma noção introdutória acerca das transformações átomo-íon. Os íons são átomos, ou grupos de átomos, com carga elétrica, de enorme interesse nas combinações.
A seguir, o autor recorre à história para facilitar o entendimento do leitor. Discute as descobertas dos átomos, explica a origem de muitos de seus nomes e permite estabelecer uma relação de dependência entre a periodicidade de propriedades dos elementos químicos e a disposição da nuvem eletrônica desses átomos.
Numa analogia com o governo e as instituições, mostra-se então a importância das combinações entre átomos, das "alianças entre membros do reino". A essa altura, começa-se a compreender o papel e a relevância das reações químicas, base da vida e princípio de todas as transformações da matéria.
E a excursão chega ao fim. Por tudo o que viu, o leitor concluirá que valeu e muito. Bem apresentado e traduzido, "O Reino Periódico" é um livro perfeitamente indicado àqueles que se interessam em conhecer melhor a natureza e suas transformações. Não é tão ilustrado quanto "A Física Moderna" de W. R. Fuchs, nem tão divertido quanto "107 Stories About Chemistry" de L. Vlasov e D. Trifonov, nem tão específico quanto "Geoquímica Recreativa" de A.E. Fersman, mas seguramente permite colocar Atkins ao lado desses expoentes da divulgação científica.

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