São Paulo, sexta-feira, 10 de janeiro de 1997
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Pior safra é a que mais vendeu no país

FERNANDO OLIVA
DA REDAÇÃO

Apesar de o lote de 50 mil garrafas do vinho francês Beaujolais Nouveau que chegou ao Brasil ter sido quase todo consumido, sommeliers e especialistas são unânimes em afirmar: esta é a pior safra que o país já recebeu.
O motivo foram as chuvas torrenciais que caíram sobre a região de Beaujolais, próximo à cidade de Lyon (sudeste da França), cerca de 20 dias antes da colheita das uvas.
Como o Beaujolais Nouveau deve chegar aos cinco continentes no mesmo dia -a terceira quinta-feira de novembro-, o jeito foi distribuí-lo de qualquer maneira. Mais "aguado" e menos aromático. Se o Nouveau já não era um grande vinho, ficou ainda pior.
Segundo o especialista Jorge Lucki, que degusta vinhos há mais de 20 anos, a explicação é que a falta de sol e o excesso de chuva prejudicaram o amadurecimento das uvas, diluindo o álcool do vinho e tornando-o mais ácido.
Ou seja, só da primeira leva de distribuição internacional cerca de 60 milhões de garrafas receberam vinho de qualidade inferior.
Os Beaujolais Nouveau enviados simultaneamente para o Brasil e outros 191 países fazem parte de um "tour de force" patrocinado pelos produtores franceses para que o vinho esteja disponível, no mundo todo, na terceira quinta-feira de novembro.
Festa
Muito ruim ou nem tanto, o consumidor brasileiro continua a beber vorazmente o Beaujolais Nouveau: esta safra enviou duas vezes mais garrafas que a de 1995.
Só a Vinheria Percussi, de São Paulo, vendeu cerca de 600 unidades em 15 dias. Para José Figueiredo, sommelier do restaurante La Biccoca, o Beaujolais deste ano "ficou parecido com um suco de uva". Só que ele vendeu 72 garrafas em apenas 10 dias.
Maurice Bibas, dono do La Bourgogne e presidente da SBAV (Sociedade Brasileira dos Amigos do Vinho), vendeu 480 garrafas, cerca de quatro vezes mais que em 1995.
Mário Telles Júnior, diretor-executivo de degustação da ABS (Associação Brasileira de Sommeliers), afirma que compromisso com qualidade não é o forte do Nouveau. "É para aqueles que não levam muito a sério o ato de beber vinho."
Mesmo com a qualidade comprometida, o Nouveau continua custando caro. No Brasil, paga-se de R$ 16 a R$ 20 por uma garrafa, valor que é suficiente para comprar vinhos melhores, franceses ou não. O Morgon 95, por exemplo, um dos melhores Beaujolais do mercado, vale cerca de R$ 15.
Se o vinho não é bom, por que está fazendo tanto sucesso? De acordo com Lucki, o típico consumidor de Beaujolais Nouveau está mais preocupado com a festa que envolve a chegada do vinho que com sua qualidade. "Eu acredito que ele não tem capacidade de definir se o vinho está bom ou não."

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